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segunda-feira, 23 de maio de 2011

Copa sim, despejo não! ou Eu não sou daqui...

"...Porém, porque peço silêncio não creiam que vou morrer. Passa comigo o contrário, sucede que vou viver. Sucede que sou e que sigo. (...) Sucede que tanto vivi, que quero viver outro tanto. Nunca me senti tão sonoro, nunca tive tantos beijos. Agora, como sempre, é cedo. Voa a luz com suas abelhas. Me deixem só com o dia. Peço licença para nascer." ... (Pablo Neruda)

Já estou em Mariana/Ouro Preto desde o final de semana. Ouro Preto é uma cidade mágica. Suas ladeiras, seus morros, as casinhas, o verde, as cores (as muitas flores, todas tão lindas, oh, Deus, das mais vagabundinhas e pequerruchas de beira de caminhos às mais raras), as ruas que me lembram canções de ninar (ouço tanto em meus ouvidos quando por lá caminho aquela sempre canção...se essa rua, se essa rua fosse minha, eu mandava, eu mandava ladrilhar, com pedrinhas, com pedrinhas de brilhantes para o meu, para o meu amor passar...). Enfim, gosto das bandas de cá. E gosto dessa coisa de interior, de as pessoas serem solícitas como foi uma senhora chamada Vera que encontrei na rodoviária de Ouro Preto: me ajudou com as bagagens, conversou conversa mole comigo, me deu boas-vindas e disse onde morava para, no caso de eu me demorar por aqui, ir visitá-la. E o motorista do ônibus que, sem pressa, me deixou colocar as malas na frente, aguardou eu entrar e pagar e me sentar, para então colocar o carro em marcha...
Mas, vou viver essas cidades em seu dia-a-dia para ver o que rola, para sentir suas instabilidades, suas lutas diárias e aí sim falar mais sobre.
Digo tudo isso porque passei uma semana em BH e quando, ontem, me perguntaram o que achei de BH eu tinha respondido que gosto do clima meio cidade grande e meio interior que BH transpira. E falei a verdade. Lá é isso mesmo para mim.
Mas, quando fui dormir, sob um frio quase insuportável (já aqui em Mariana), vestida em duas calças, duas meias, com luvas, e quatro camisas (dois casacos, uma normal e outra de manga comprida) e ainda assim tremendo de frio. Ok, esquecemos eu e Maria uma janela aberta e isso foi o suficiente para eu imaginar que morreria congelada e a pensar como estariam as pessoas que não têm casa e que mesmo em albergues quase nunca estão suficientemente protegidas - esse pensamento não veio de um  sentimento de caridade cristã, mas de uma constatação política: eu passara, na semana anterior, todos os dias pela Vila Recanto UFMG, localizada na Av. Antonio Carlos. Nessa avenida, nessa vila, famílias e famílias estão sendo despejadas por conta das reformas das cidades que sediarão a Copa das Confederações em 2013 e a Copa do Mundo em 2014.
Eu cortava caminho justamente pela vila já sendo demolida. Restos de vidas ali entre montes de pedras, muita areia e transeuntes (geralmente universitários). Nas paredes, algumas pichações de reivindicação por justiça (ao menos nas indenizações).
Chamou a minha atenção repetidas vezes ter encontrado no fim da tarde uma moça jovem, sempre sentada numa cadeira quebrada (sem o encosto) com o olhar triste ou perdido, no meio de escombros. Pensei em fotografar todos os dias o ambiente que me parecia cada vez mais desolado, destruído, em ruínas. Porém, quando vi crianças (muitas) correndo, brincando, suas bonecas expostas na terra... Entendi que era invasão demais fotografar aquilo. Já era invasivo demais eu cortar caminho por ali, ver aquilo tudo e nada fazer...Presenciar as mudanças impostas e injustas das paisagens, das histórias, das memórias das pessoas...
As imagens foram fotografadas por minha cabeça que a tudo rememorou na noite de tanto frio de ontem. Pensei na moça sentada esperando sabe-se lá o que, nas crianças com suas bonecas quebradas e sujas de terra. Da terra que restava de suas casas. E me senti filha-da-puta, despolitizada, inerte... E pensando que enquanto estivermos gritando, torcendo pelo Brasil  em qualquer partida de jogo da copa em 2014, aquela menina da boneca de terra também estará talvez junto à moça da cadeira que, por ver o Brasil ganhando ou perdendo, estará, quem sabe, menos desolada que nessa semana que passou.
Esquecidos todos nós do lema Copa sim, despejo não!

sexta-feira, 18 de março de 2011

Para esquentar os motores

Nunca mais escrevi por essas plagas.  Esse o lugar de encontro de pessoas que vivem tão perto e que tanto se encontram e que desencontram também. Eu vivo me desencontrando de mim. E nesses desencontros, quase me perco e quase perco a vontade imensa que sempre tive de escrever nesse Maracujá. Esse Maracujá que se assemelhou tantas vezes ao pequeno planeta do Pequeno Príncipe para mim. Lugar onde bastava eu afastar a cadeira um tantinho para ver um pô-do-sol. E quando eu estava triste, afastava a cadeirinha (que é escrever aqui no blog) quantas vezes fossem necessárias para que a tristeza se esvaísse um tiquinho.
Nem sempre se esvaía a tristeza, mas risos eram arrancados de mim. Outras vezes a discussão azedava, enrugávamos a testa todos nós e escrevíamos. Criávamos e matávamos demônios. Azedávamos e açucarávamos esse Maracujá conforme nossas tristezas, alegrias e convicções.
O Maracujá era filosófico, literário, psicodélico, musical, gastronômico, polêmico, de declarações de amor, cinéfilo. Maracuja danado, polissêmico, inententível, composto por pessoas malucas, que se amam, que são tão iguais e tão diferentes. O Maracujá poderia se chamar também mixórdia, miscelândia, samba do criouolo doido ou simplesmente o blog de Nina, Jadson, Tiago e Wesley.

Mas, por um tempo, mesmo ainda acreditanto nisso tudo: embarguei. Vinha aqui e até tentava. Mas, não saía nada. Ou não saía como eu gostava: de coração, com vísceras, cortante, pulsante. Eu e minha cadeirinha de ver pôr-do-sol quando estou triste.

Aqui eu não ligava para as recomendações quanto às redes sociais: cuidado com o que você escreve, as pessoas estão te observando, elas fazem juízo de você. As pessoas fazem juízo umas das outras por tudo (inclusive eu): pelo que alguém ouve, pelo que alguém lê, pelo que fulano assiste, pelo que ciclano veste... Esse aqui é só mais um meio para que alguém que goste de enquadrar as pessoas por tipos, colocar tarjas de "descolado", "feliz", "triste", "inteligente", "contido", "introspectivo", "louco", etc.fazê-lo e ainda achar que o modo de escrever, as coisas escritas realmente cristalizam as pessoas. Como se não houvesse a possibilidade de mudanças, de encher o saco de tudo e mudar, de reler o que se escreveu e entender que nem sempre se é tão convicto assim das coisas, ou, ao contrário, compreender que não se muda mesmo: o que escrevi hoje é o que pensava há anos e será o que vou pensar daqui a muito tempo.
A gente muda e permanece. A gente é e não é. E a gente é tão complexo que não cabe muito em uma classificação qualquer, barata e apressada.
Eu me transformo a todo o momento. E com isso assusto as pessoas que me rodeiam e a mim mesma. E nem sempre isso é bom e nem sempre isso é ruim. Muitas vezes é mesmo é necessário.
A gente descobre, a gente inventa, a gente re-inventa. A gente muda de cidade, de religião, de corte de cabelo, de amor, de curso. Assim como a gente não deixa de amar a mesma pessoa, de lembrar as mesmas lembranças, de gostar do cabelo sempre curto ou sempre longo.
Por isso adoro quando Clarice diz "gênero não me pega mais".
Gênero nenhum me pega mais. Fato. E acho que não pega a nenhum de nós daqui do Maracujá.
E essa mesma mulher que fala sobre gênero não mais pegá-la, fala também, noutro texto, sobre termos bastante cuidado com o que mudamos em nós, especialmente sobre defeitos (é de se pasmar com isso!), ela nos diz que há defeitos que seguram toda uma coluna...
E complicação, paradoxos, comunicação tronxa nunca deixou de ser o nosso forte aqui, portanto...me sinto agora bem-vinda a recomeçar a escrever aqui. De coração, tronxamente, paradoxalmente, com defeitos seguradores de colunas em mim e com mudanças que nem eu mesma posso imaginar. Yudo junto num só Maracujá.

E o que me moveu a voltar a escrever aqui foi o fato de Jadson estar indo embora (mudando, portanto) para Brasília para fazer o mestrado dele.
O Maracujá continuará sendo nosso ponto de encontro nos encontros e desencontros de nossas vidas. Nas mudanças e nas mesmices. Até que cessemos de azedumes e doçuras e cambiemos para outras formas de nos (des)comunicarmos.

Assim: que venham doces e azedos, que venham demônios e anjos. Que voltemos a nos comunicar assim: trágica e comincamente como tem sido desde que estamos juntos nesse Maracujá.

E, por falar em mudanças e mesmices, recordo aqui o dia em que caminhava eu pelo centro da cidade e uma moça me chamou com dúvida:
- Nina?
Eu respondi com certeza de nunca tê-la visto:
-Sim, sou eu.
E ela disse em forma de pergunta de novo:
-Você é a filha de Dona Deise?
-Sim, sou.
-Eu fui sua babá! Você tinha uns dois ou três anos. Você continua com a mesma carinha: só cresceu!
E conversamos um bom trecho amigavelmente, ela recordando coisas que minha mãe me falava e eu não lembrava... Mas, bastou a senha "você é filha de Dona Deise" para que eu me achasse íntima daquela que cuidou de minha numa infância longíqua e esquecida.
Nos abraçamos e eu me emocionei ao deixá-la na rua Laranjeiras com uma parte de minha vida.

Dia desses, estou eu estudando na Bicen quando me chega um rapaz e me diz:
- Sabia que estudamos juntos?
Eu respondi:
- Não.
E ele disse:
- Fizemos datilografia informatizada no Senac em Propriá. Eu tinha uns dez anos, você deveria term uns quinze. Eu era aquele guri que dava choque em todo mundo...
Eu não recordava dele, nem de seus choques nem das coisas outras que ele me falou. Recordava que fiz esse curso e de apenas uma pessoa que ele falou que também frequentava as aulas.
Rimos de alguém em alguma época ter feito um curso desses e ri dele com dez anos de idade fazer o tal curso.

A memória me prega peças. Nem sempre está tão viva em mim. Mas, o que me assusta é que se me olho no espelho, me acho tão diferente...e as pessoas teimam em me reconhecer, em me falar que continuo a mesma...E um grande amigo meu, paradoxalmente, me olha e me diz sempre: "Nina, você está tão diferente!". Peço que ele me explique como, por que, em que...e ele só faz cara de agoniado e me deixa com minhas mudanças e minhas mesmices a não entender muito...
E um outro querido amigo me disse: "Destes seis anos que te conheço, acho que essa é a terceira Nina que vejo".

Eu mudo. Ainda que permaneça a mesma.
E assim o é com todo mundo, por incrível que pareça a cada um.
Dessa forma: para que taxar, classificar?

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Sabe quando uma mesma coisa acontece mil vezes e a gente nao se dá conta ou finge nao ver ou tenta remediar? Mas, a coisa acontece e acontece e de repente: a gente, retardariamente, enxerga e: PIMBA! A gente entende e nao sabe direito o que faer...Mas, talvez o primeiro passo seja nunca mais deixar a coisa se repetir...Enigmático isso? Sim! Mas, quero muito poder escrever minhas coisinhas enigmáticas ou nao...As coisas me vêm à cabeca e gosto de soltá-las aqui que por muito tempo considerei um espaco de liberdade para tal, um espaco de matar e criar demônios e depois de tudo: paracalmar...
Gosto tabmbém da nao explicacao e da nao explicitacao. Gosto dos mistérios também. Especialmente dos mistérios gozosos (como diria Afonso Romano de Santana).

P.S.: nao sei onde ficam o cedilha, o tio e o bichinho que parece com aspas para colocar no sobrenome Santana...É a vida!

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Da coisa pública

Meu celular está quebrado. Não ouço as pessoas, apesar de elas me ouvirem muito bem quando me ligam ou quando eu ligo para elas.
E entre ontem e hoje eu precisava urgentemente resolver um assunto que não é simples. Envolve muitas outras coisas. Sentimentos. Os dias têm sido difíceis há tempos por conta disso. É tocar numa ferida que não se fechou ainda.O processo de transportar os ossos de minha mãe do cemitério daqui para o cemitério da cidade de Propriá é um assunto que fragiliza e me coloca diante de um mundo duro, que se importa apenas com dinheiro e onde questões de vida e de morte viram meros comércios.

O fato é que entre ontem e hoje precisei usar o telefone para falar com taxista para fretar carro, para falar com as pessoas responsáveis pelos dois cemitérios das duas cidades. E tudo isso em frangalhos, mas tendo que ficar forte, pois deve-se engolir os choros para falar com essas pessoas...Afinal de contas, é o dia-a-dia delas e elas não compreendem muito bem.

Não tendo telefone fixo, precisava de orelhões. E eis que começaram os martírios adicionais. Em quase todos os orelhões que fui, no centro da cidade, quase nenhum deles funcionava. Depredação total.
A cada tentativa, eu me sentia mais desamparada. A sensação era essa. Desamparo. Enfim, consegui resolver depois de oito tentativas.
Quando entrei no ônibus para voltar para casa, notei chicletes no lugar onde as pessoas se apóiam, na barra onde os passageiros colocam as mãos. Imaginei o quanto deve ter parecido divertido ou "coisa de gente revoltada" para quem fez aquilo.
As pessoas já não se incomodam com as outras há tempos. Mas, o processo já tem ficado acéfalo. Orelhões públicos, barras de ônibus são coisas que todos nós usamos. Inclusive as pessoas que depredam podem precisar um dia, uma noite, numa ocasião qualquer. Ainda que isso possa parecer difícil de acontecer para elas.
Mas, o sentimento de ser super-homem, super-mulher, super-humano tem sido cada vez mais forte. O que fazer? Enquanto as dores forem de cada um e pronto, será sempre assim. Processo crescente de acefalia, depois de um já conretizado processo de petrificação do coração...

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Memória, tempo, sistema, constatação?

Ainda estou elaborando essa minha ida à cidade da infância.
Vi algumas pessoas queridas. Soube notícias de tantas outras.
Constatei uma coisa triste: muitas de minhas amigas, colegas de escola, casaram-se e foram "maltratadas" (palavra mais comum de se ouvir nas conversas) pelos maridos. Quase todas tiveram filhos. Umas separam-se, outras ainda não...
O fato é que percebi a permanência de um sistema acabrunhado, preconceituoso, opressor, contrário às diferenças, contrário aos direitos da mulher.

Vou elaborar muito tudo o que vivi em dois dias.

"Tempo amigo, seja legal, conto contigo, pela madrugada..."

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Nota

Já encontrei os livros que queria. Inclusive e especialmente o da Ecléa Bosi. Todos os exemplares estão intactos.
O modem já voltou da "manutenção" e, portanto, já tem Internet na Bicen.
Mais, calma, percorri, com os números das chamadas devidamente anotados, e muita atenção, as prateleiras.
Dará para sobreviver, sim. Havia o susto, o impacto das trocas de lugares, do alvoroço de pessoas a procurar livros, etc. Mas, não foi tanto exagero meu observar as coisas observadas do post anterior.
E, seria legal deixar claro que assim que deparei com as portas fechadas da bicen, procurei conversar com um bibliotecário, uma pessoa super gentil e acessível, que me recebeu muito bem e me explicou algumas coisas sobre o funcionamento, na verdade, sobre as dificuldades de funcionamento da Bicen na UFS,  e sobre o ocorrido, etc. Não vou citar nomes publicamente, mas é só para marcar que procurei informações e fui fazer a minha reclamação "meio oficial". Isso é para me proteger de pensamentos apressados sobre a minha fala de que "só aqui para uma biblioteca fechar durante um mês, reeabrir, sem explicação alguma...".
Mas, já estou fichando o livro.
Já está tudo se encaminhando...
Mas, o silenciamento de todos juntos, continua a me incomodar... Ao menos numa questão como a da Bicen.

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Da dificuldade da maternidade

Um motivo de grande confusão para alguns homens: a barra da saia da mãe.
Quantos deles confundem amor com obrigações (não só domésticas, mas sejam quais forem)?
Quantos deles acham que uma mãe por ser mãe deixa de ser mulher e quantos ainda não compreendem que uma mulher por ser mulher nem sempre tem de ser mãe?
Daí minha dificuldade (entre tantas e tão variadas) em relação à maternidade: se eu parisse um guri, um "menino-home"como se diz na minha terra tão louvadora do sexo masculino, o que eu faria dele? O que permitiria (e o verbo é proposital, visto que muitas mães permitem mesmo) que ele fizesse de mim?
Se eu aplicasse tudo o que eu entendo como passível de fazê-lo üm filho de cuca legal" será que ele não sofriria muito nesse mundo configurado tal como está?
E se eu reproduzisse os pequenos vícios naturalizados que configuram o grande, o imenso e aderente (e muitas vezes disfarçado ou mesmo invisível) machismo do mundo só para salvaguardar um provável bem-estar do guri no mundo (do tipo: ele nãos eria o inadaptado, o extraterrestre)?
Não sou daquelas que acreditam em meio termo. Por isso eu me acredito "o exagero".
Não acreditando eu em meios termos só posso conceber que ou se é machista ou não se é machista.
E eu não queria parir e criar (educar, fazer) um machista. Nem enquanto mãe, nem enquanto mulher.
Por isso, venho construindo a idéia de que o mais correto sou eu não parir.
Além, claro de concordar com Machado de Assis em Brás Cubas: para quê vou perpetuar uma raça como a dos homens, para que deixar sementes?

Mesmo sendo a contradição em pessoa e pensando que seria muito lindo e singular parir, criar, dividir um pouco de minha vida com uma outra criatura. Gestada e parida por mim ou (o que muitas vezes pensei) escolhida por mim, adotada, irmanada na alma.

De qualquer forma: mais medo de criar (educar, fazer, contribuir) uma pessoa nada boa do que de parir ou de errar numa escolha...

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

As sereias

Eu gosto muito das sereias.
Em pequena, queria porque queria ver uma. Ia para a beira do rio. Chamava. Esperava. E, certo dia: senti um medo tremendo.
Saí da margem do rio que era o rio de minha infância sem voltar o olho para trás.
Imaginei a figura de Iemanjá gigante, saindo do mar. E fiquei apavorada. E calada, entrei em casa e fui dormir.
Dia desses, chegamos eu e um grupo de amigos à conclusão de que criança quando acha que fez merda, vai dormir.
Eu sempre ia dormir nessas situações, causando, assim, suspeitas seriíssimas...

Ainda hoje gosto das sereias.
Fato.
Elas são animais, que refletem a beleza feminina e, por isso, são belíssimas e têm um canto tão insólito que encanta, apaixona os homens.

Senti medo naquele dia em que fui dormir mais cedo do canto da sereia.

O mar.
O mar é o meu grande mistério e salvador.
As águas, para ser mais clara e verdadeira.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Rua de mão única

Gosto muito de Walter Benjamin.
Não é por pimbice não (risos). É mesmo por me sentir inapta tantas vezes a compreender quem escreve muito difícil. E Benjamin nao escreve difícil (ao menos sempre). Rua de mão unica, por exemplo, trás uma escritura leve, brincalhona, erótica, porque trata de coisas tão cotidianas, tão perto de nós de maneira táctil ou a apertar o botãozinho mais emotivo para mim que é o da memória. A relação que o moço traz com os livros é assim:

I. Livros e putas podem-se levar para a cama.
II. Livros e putas entrecruzam o tempo. Dominam a noite como o dia e o dia como a noite.
III. Ao ver livros e putas ninguém diz que os minutos lhes são preciosos. Mas, quems e deixa envolver mais de perto com eles, só então nota com têm pressa. Fazem contas, enquanto afundamos neles.
IV. Livros e putas têm entre si, desde sempre, um amor infeliz.
V. Livros e putas - cada um deles tem sua espécie de homens que vivem deles e os atormentam. os livros, os críticos.
VI. Livros e putas em casas públicas - para estudantes.
VII. Livros e putas - raramente vê seu fim alguém que os possuiu. Costumam desaparecer antes de perecer.
VIII. Livros e putas contam tão de bom grado e tão mentirosamente como se tornam o que são. Na verdade eles próprios nem o notam. Anos a fio alguém vais e entregando a tudo "por amor" e um dia está lá como corpus bem corpóreo, na ronda das calçadas, aquilo que 'para fins de estudo" sempre pairava somente acima delas.
IX. Livros e putas gostam de voltar as costas quandos e expõem.
X. Livros e putas remoçam muito.
XI. Livros eputas - "Velha beata - jovem devassa".
XII. Livros e putas trazem suas rixas diante das pessoas.
XIII. Livros e putas - notas de rodapé são para uns o que são, para as outras, notas de dinheiro na meia.

Dá para falar que essa pessoa não se relaciona com os livros de maneira erótica, sensual?
E isso me fascina, me faz saber das coisas. Porque simples, porque táctil. Ora, para um intelectual falar de livros: tudo bem. Mas, falar de putas e de forma poética, assim... Não, não é um estudo antropológico sobre prostituição. É uma relação. Bonita, feia, bruta, de poder, de igualdade, de necessidade, de amor... Uma relação. Assim como a com os livros.

Esse texto (Livros e Putas) se intitula "N. 13", a saber.
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E um outro texto desse mesmo livro (Rua de mão única) com o nome de "Estas plantas são recomendadas à proteção do público"traz algo que me fascina:

"Quem ama não se apega somente aos "defeitos"da amada, não somente aos tiques e fraquezas de uma mulher; a ele, rugas no rosto e manchas hepáticas, rospas gastas e um andar tortoprendem muito mais duradoura e inexoravelmente que toda beleza. Há muito tempo se notou isso. E por quê? Se é verdadeira a teoria de que a sensaçãonãos e aninha na cabeça, que não sentimos uma janela, uma nuvem, uma árvore no cérebro, mas sim naquele lugar onde as vemos, assim também, no olhar para a amada,e stamos fora de nós. Aqui, porém, atormentadamente tensos e arrebatados. Ofuscada, a sensação esvoaça como um bando de pássaros no esplendor da mulher. E, assim, como os pássaros buscam proteção nos folhosos esconderijos das árvores, refugiam-se nas sensações sombrias rugas, nos gestos desgraciosos e nas mdoestas máculas do corpo amado, onde se acocoram em segurança, no esconderijo. E nenhum passante advinha que exatamente aqui, no imperfeito, censurável, aninha-se a emoção amorosa, rápida como uma seta, do adorador".

Ai como gosto de ver o amor assim. E a beleza idem. Essa coisa táctil e verdadeira, que vai acontecendo, amadurecendo...O corpo é isso. Mas, não deixa de ser belo, desejável, poema e erotismo.

Para fechar a minha declaração de amor (e não de pimbice - mais risos) a Walter Benjamin e a seu Rua de mão única, deixo a dedicatória que ele fez do livro à sua amada italiana:

"Esta rua chama-se Rua Asja Lacis, em homenagem àquela que, na qualidade de engenheiro, a rasgou dentro do autor".

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

Às vezes eu acredito em Deus. Talvez porque eu precise de poesia.
E Deus é um pouco poesia.

domingo, 1 de agosto de 2010

Canções de Baal

Sexta-feira, enfim, assisti ao Canções de Baal, de Helena Ignez.
Antes, ela prórpia, em terra sua - a Bahia- o apresentou. Estava com uma bata cor de goiaba e meias coloridas, dessas que lembram pinturas, parecem-se com tatuagens...
Na entrada da sala do TCA (Teatro Castro Alves), quando a avistei, não pude deixar de lembrar-me do filme do Sganzerla em que ela, roda a cidade, a gritar: "Eu não sou tarada, eu não sou tarada!", depois (ou antes) de repetidas frases de medo da velhice.
Ela era bela, jovem.
Hoje, seu rosto já envelhecido, guarda sinais de uma beleza sapeca e brehtchiana, avacalhadora da época daqueles filmes. E seu tamanho mignon faz com que nunca esqueçamos daquela Helena da Boca do Lixo.

Voltando das minhas viagens, ouvi uma garota falar: "O que é que o rock não faz com as pessoas, não é?". Falava, rindo-se muito, que encontrara Helena Ignez no banheiro  (antes da apresentação do filme) e olhou para ela e pensou logo essa coisa do rock, achando-a acabada, velha... E mais adiante, ironizou: "Será que devo esboçar alguma emoção, afinal de contas "fulano" me disse que ela teve uma importância tão grande pro cinema brasileiro...não, acho melhor eu ir fazer xixi".
Essa pessoa diz ter uma ligação muito forte com fotografia e vive frequentando cursos de cinema, etc.
Oquei.

Vamos ao Canções.
Terminada a sessão, é importante eu falar, eu disse: "Ufa! Valeu ter namorado Glauber, Bressane e Sganzerla, viu?".
Comentário machista, infame, piada sem graça. Era o dia de Helena (inda bem que ela não nos ouvia)!

Gostei muito do filme. Belo. Dionisíaco. Avacalhado, sem ser a fórmula do cinema da Boca. Leia-se: não é nostálgico, não é re-leitura de uma época. Não é o filme que a atriz desses tantos filmes das décadas dos 60 e 70 poderia fazer. E muito menos pode-se dizer que ela é um Bressane ou, mais ainda, um Sganzerla de saias. Apesar de o filme guardar um diálogo com Sganzerla sim. Esse que não só foi o grande amor da vida de Helena, mas um grande diretor de cinema do Brasil.

A arte é esplendorosa nesse filme de Helena Ignez. Os planos são de uma elaboração feliz. E Baal, cafajeste macunaimizado, que come as mais belas ninfetas é posto com tamanha sensibilidade para a gente que não dá raiva, que, ao contrário, emociona.

Como o filme se propõe um filme de canções, as músicas e versões cantadas por Careqa são uma mistura de nonsense e poesia, de tirar o fôlego.


Helena Ignez é uma atriz brechetiana e faz um filme em homenagem a Brecht. Assim, temos como primeiro plano a entrevista deste, em língua inglesa, dando satisfações aos americanos no Comitê de Atividades Anti-Americanas. E, todo o filme é permeado por essas falas e a todo momento, desse modo, somos chamados atenção para o absurdo da existência de comitês desse tipo à época e, consequentemente, somos levados a pensar nos resultados disso para nós, hoje.
Temos um Einstein interpretado por ator brasileiro que é espetacular ao nos fazer pensar a antropofagia cultural que arranjamos por aqui no Brasil e que perpetramos, agora, noutros moldes - e é esse o ponto do filme de Helena Ignez: ela fala dessa antropofagia hoje.
E, por mais que eu tenha dito que Baal é um cafajeste macunaímico, não podemos, por conta do colorido do filme, das sacanagens de Baal, da sedução deste, da preguiça e da boemia suas também, não podemos dizer que Helena não lança um outro olhar a todo esse processo que seja diferente do dos anos do cinema marginal.

E a estetização, a homenagem que ela faz a questão cinematográfica mesma, nos informa isso. Helana faz opções e segue um caminho que é dela própria. Isso é muito fortalecido nas aparições de Djin Sganzerla numa projeção de filme numa parede e nas aparições de Simone Spoladore no banho de cachoeira (vide a foto da postagem) e, mais adiante, num tipo de tanque, com águas esverdeadas, como se fosse uma tela (são as águas do cinema, sua fluidez atualmente debatida?).

Estou ainda em Salvador. Já já viajo. Estou cansadíssima e, por esse motivo, talvez não consiga atingir o ponto que eu quero falando de Canções de Baal se não for do jeito que sei falar de cinema, de filme que me deixa feliz em assistir: É um filme do caralho e que me deixou feliz. É bonito, é de uma sensibilidade singular e, para mim, guarda importância por ser dirigido por ela, que é uma das atrizes brasileiras que mais admiro.

P.S.: não poderia deixar de frisar que nas cenas iniciais, no encontro de Baal com figuras nada comuns, (doente, velhos, drogados, loucos, nus, degradados) bebendo champagne, a velha que abrira as portas para Baal aparecer no filme, para nós telespectadores, ela fala: "Não entendi nada". E, Baal, olhando direto para a câmara, ou seja, para o cinema ou para cada um de nós escpetadores, responde: "Se alguém que ouviu uma história diz que entendeu tudo é porque a história não foi bem contada".

Ui. Tome-lhe bofetada na cara dos que saíram da sala (porque sempre há essas pessoas, assim também aconteceu na exibição de Saló, de Pasolini, um cara saiu dizendo que para ver pornografia, viria na Internet mesmo) ou dos que se propõem a estudar fotografia, cinema, seja lá o que for e não sabem dar a devida importância a Helena Ignez. Ui, tome!
Se bem que teve gente que me respondeu, quando comentei isso ao vivo e a cores, que não era todo mundo que tinha a obrigação de gostar das coisas que eu gostava.
Como se eu tivesse impondo um modo, um gosto por achar estranho alguém desconhecer a existência de Helena Ignez quando se propõe a estudar cinema no Brasil.
Oquei.

P.S. do P.S.: a homossexualidade é abordada de maneira singular também aqui nesse Canções de Baal...

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Sentimental bairrismo ou necessidade de re-conhecer?

Hoje estou sentimental (e bairrista?). Vontade de haver um poeta para cantar essa minha terra. Tão misturada. Tão contraditória. Tão dentro de mim. Gosto de pisar nesse chão. Mesmo que eu fale, tantas vezes mal. Hoje vi um homem carregando um boi pela feira, pelo centro de uma cidade do interior. Crianças de uma escola, na hora da recreação, cantaram: "Boi, boi, boi, boi da cara preta/ pega essa menina que tem medo de careta...
Ontem, vi um velhinho, corcunda, andando quase emborcado...
As caras tão marcadas. As velhas com coques na cabeça. As motos e os cavalos convivendo num mesmo espaço caótico, entremeeiro, nonsense.
Quero muito poder ainda viver os muitos lugares daqui de Sergipe. As cachoeiras da Ribeira, as praias em Pirambu, as cidades, a região da Grota do Angico que me encantou tanto quando fui lá: a carvalhada, as pessoas que carregam o mito de Lampião como parte de suas histórias de vida.
E, tanta coisa que nem posso falar/descrever pelo fato de eu ter 28 anos e conhecer tão pouco ou mesmo não conhecer nada.
E, acho que por isso, tantas vezes para mim é fácil me encantar com outras terras, outros lugares que não esse aqui tão vivo, tão pulsante, tão latente e tão despercebido.

Não há luar como esse do sertão...

Dia desses, fui a um sítio localizado em um interior  em Itabaiana (portanto, bem pertinho de Aracaju) chamado Sambaíba.
Lá, passei toda a tarde e um bom pedaço da noite. Comemos amendoins colhidos e cozidos assim: na hora. Jogávamos as cascas na terra e sabíamos que as galinhas e as cabras viriam comê-las.
O tempo era longo, desmanchado, lento. O feijão verde do almoço foi colhido e cozido da mesma forma. O limão, a laranja, o maracujá para a cachaça: idem.
Os cheiros característicos: fortes ou suaves demais inebriavam. O barulho do vento nas árvores, nas plantas descansava os ouvidos acostumados a barulho de carros, a buzinas e freadas.
Quando a noite veio, no céu a lua era minguante. Mas, nem por isso, menos faceira. Bonita, tomando forma, mais parecia adolescente que procura seu lugar no mundo, que procura significar uma nova corporeidade que simplesmente lhe toma.
A noite trouxe outros sons. O coaxar de muitos sapos, as cigarras, os grilos. Os sapos pareciam uma grande comunidade de políticos que discursavam, que debatiam assuntos comuns e importantes.
O vento frio, criava um clima agradável.
E, depois de tanta cachaça, esquentamo-nos com café. Puro. Cheiroso.
Eu não queria mais sair de lá.
E ainda tinha a presença de Zé Arnaldo. Caseiro do sítio. Sua mulher, arredia, dessas "envergonhadas", como eles dizem, passava sempre muito longe, distante, olhando de soslaio.
Mas, Zé Arnaldo ficou entre a gente e conversava muito. Contava suas aventuras da época em que bebia muito e, que uma vez bêbado, virava valente, queria brigar com todo mundo.
Zé Arnaldo começava com o 21 e depois "rebatia a bucha" com cerveja.
Ameaçava a mulher, dava murro no dono do bar. E, no outro dia, Zé Arnaldo não lembrava de nada. Contavam-lhe suas astúcias e ele ia, envergonhado, pedir desculpas.
Foi uma tarde boa.
Quando fomos embora, passamos por um caminho de terra molhada. O carro que nos levara havia atolado na frente, na porta do sítio e fomos escorregando, afundando os pés na lama até lá. Em fila indiana: eu, Rogério, Paulo, Fernanda, o casal que nos recebera e Zé Arnaldo.
Zé Arnaldo nos ajudava, segurava as nossas mãos, apoiava moralmente na travessia.
Durante a tarde toda, notei uma tatuagem em seu ante-braço. Quis perguntar, mas fiquei encabulada.
Quando nos despedimos de verdade, percebi um nó em minha garganta. Eu sentiria falta de Zé Arnaldo. De sua magreza, de sua solicitude, de sua amizade.
Zé Arnaldo dividira uma boa parte a vida dele comigo, num alpendre do sítio. De sua viagem à Salvador, de sua infância, de seus estudos até a 4ª série, de uma cadelinha que ele teve e que se chamava Bolinha.
Zé Arnaldo me contou o seu grande sonho: comprar uma casinha.
Disse-lhe adeus com um sentimento de perda.
Na estrada, de volta, olhava o breu ao lado. Sentia o cheiro forte da mata. Coloquei a cabeça para fora da janela do carro e olhei o céu. Azul escuro. Cheio de estrelas. Todas elas tão coladas, meu Deus.
Lembrei de minha mãe. De minha infância. E pensei: Zé Arnaldo, será mais uma lembrança querida. Dessas que a gente não fala, mas sente.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Fui-me embora. Doía-me os pés e a cabeça. Sangrava a alma e a cara carregava um riso plácido, meio bobo, como que contrariando tudo o que por dentro se passava.
Busquei a lonjura dos lugares para acertar as contas comigo mesma. Que é que era isso de por dentro uma coisa e por fora: essa cara risonha?
Comigo não seria mais assim não.
Contradição é uma coisa. Estudada e muito e desde sempre. Mas, essa da cara já era mesmo implicância e não pura incoerência nossa de todos os dias.
As lonjuras não possuem espelhos. Não possuem primeiros socorros. Visto que os últimos me cabem muito bem.
As privadas das lonjuras são imundas. Fedem. E é como se fosse um tipo de sofrimento necessário no sentido cristão da palavra sofrimento. O fedor como se fossem lapadas de chicote nas costas de um monge.
Faz frio nas lonjuras. Chove e fica tudo cinza. O vermelho é só do corte. Do pé e da alma.
A cara não sei como anda. Não a vejo há dias.  Às vezes a sinto como se estivesse vermelha. E penso: sangra? Não levo a mão ao rosto. Nada de carinhos.
Fui-me embora.
Depois, eu volto.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Eu me transformo em outras, um filme perturbador...

Bom, depois de ouvir meus admiráveis e amados amigos falarem, em diversas situações, que para driblar a insônia, velha companheira de todos nós pelo vsito, assitem a filmes, eu decidi aderir ao tal remédio.
E, noite dessas, insone, coloquei um filminho para relaxar: Inland Empire, de David Lynch.
Ok. Quase três horas de uma versão "eu não tô entendendo que não vou conseguir parar de ver e só tô entendendo que isso não vai me relaxar em nada esta madrugada".
E foi exatamente assim que se deu: assisti até o final. Não relaxei. Inquietei-me deveras. Com aquela história que a princípio reduzi: é uma atriz pirando por ser atriz, por interpretar outras pessoas... Lembrava-me de Persona de Bergman e achava que era um jeito de David Lynch lidar com um tipo de "influência" (no bom sentido). Tão bom sentido que havia asseverado e muito na proposta de uma mulher enrolada nas brenhas do pensamento. Em Bergman eram duas as atrizes e ele, Lynch, nos apresentava uma só a viver várias.
Logo desisti desse reducionismo. O filme era por si mesmo uma linha tênue. Uma transgressão. Um borrão (não acho boa essa palavra) que me deixava no mesmo limite: também eu me transformava em outras a cada minuto que se passava, que eu vivia, que experienciava o filme...
E o que é Inland Empire? E aquela cara assustadora e aquela câmera tão singular quando eu achava que ok, as coisas já estavam resolvidas...
O bom foi que viciei nessa tática. E se assistir a filminhos por conta da insônia não melhora a insônia, me deixou acordada de maneira muito mais instigante.
Fiquem com a imagem-sensação que me impressionou e me fez soltar um "puta caralho" na madrugada e com o conselho de que é bom sim assistir a filmes com insônia, se não acalma: perturba: é o que há. E eu gosto disso.

sábado, 19 de junho de 2010

Dos lugares - Zicartola


Em Buraco (apelido carinhoso de nossa querida cidade), é comum reclamarmos que não há um lugar para irmos. Os lugares são ou elitizados ou alocam eventos que começam muito tarde da noite e, por esse motivo, torna-se de difícil acesso para quem não tem carro ou, no mínimo, carona certa.
Os domingos em Buraco são entediantes, os sábados mal-aproveitados, etc.
Como havia postado algo sobre o grande Cartola, não resisti e busquei um vídeo para mostrar um pouco do que foi e do significado do restaurante Zicartola: espaço onde havia excelente comida, pois Zica cozinhava muito bem, e excelente música, a saber, foi lá que teve nascimento a carreira de Paulinho da Viola!
Um trecho dessa história segue abaixo, retirado do livro "Paulinho da Viola, sambista e chorão", de João Máximo:

“(...) Zicartola, restaurante que Angenor de Oliveira, o Cartola, iluminado compositor, e sua mulher Zica, exímia cozinheira, abriram no sobrado da Rua da Carioca, 53. O restaurante foi uma espécie de extensão das reuniões que se faziam em outro local, o segundo andar da Rua dos Andradas, 81, onde funcionava a Associação das Escolas de Samba e onde Cartola e Zica viveram por algum tempo, ele como vigia de todo o prédio. Cartola – depois de longo sumiço que levara quase todo mundo a supô-lo morto – fora redescoberto por Sérgio Porto enquanto lavava carros em Copacabana. Para Sérgio, aquele negro magro, de nariz estranho, tumoroso, era o personagem principal das histórias que o tio Lúcio Rangel lhe contava, ilustradas por sambas admiráveis. Redescobrir o ‘falecido Cartola’ foi como dar vida a uma lenda. E Sérgio, cronista mais conhecido como Stanislaw Ponte Preta, teria todo o direito de gabar-se disso até o fim de seus dias.
O que se passou na Rua dos Andradas foi assim como se o Brasil quisesse recuperar o tempo perdido sem a música de Cartola. Pois era justamente para ver e ouvir Cartola que iam lá incontáveis sambistas, de início os mais ligados à tradição, como Zé Kéti e o jovem Élton [Medeiros]. (...) Zé Kéti aproximou-se de Cartola porque este tinha uma idéia: organizar um conjunto de samba a ser batizado de A Voz do Morro (...) O (...) conjunto – formado entre outros por Cartola, Nélson Cavaquinho, Jair do Cavaquinho, Nuno Veloso, Zé Kéti e o jovem Élton – não passou da idéia. O que não impediu que aquelas reuniões musicais ganhassem fama. Em pouco eram prestigiadas não só por representantes da bossa nova, como Carlos Lyra e Nélson Lins e Barros, mas por gente de outras cidades, outros estados, fazendeiro fretando avião a fim de levar seu povo para conhecer Cartola. Resultado: o sobrado ficou pequeno para tanta gente. Por isso Eugênio Agostini, um empresário louco por samba, deu a Zica a idéia do restaurante. Ele e os pri
mos Renato e Fábio seriam seus sócios, naturalmente bancando os gastos iniciais. Os pratos dela e os sambas de Cartola haveriam de fazer o resto. Que ela mesma procurasse o lugar para a nova casa. Andou, andou e achou o sobrado da Rua da Carioca.
O Zicartola duraria pouco, apenas 20 meses. Mas marcaria de forma profunda a vida cultural da cidade, ou mesmo do país, na música, no teatro, na poesia e nas idéias que eram discutidas nas noites das quartas e sextas-feiras, às mesas distribuídas pelo pequeno restaurante. Começou a funcionar em 9 de setembro de 1963, mas só em 18 de outubro foi considerado pronto para a inauguração oficial. Pratos e sambas não seriam o bastante para compensar os prejuízos causados pelos muitos amigos que chegavam, ouviam música, comiam, bebiam e penduravam as contas para nunca mais (sem falar nos que andaram metendo a mão na contabilidade de Cartola, grande artista, péssimo negociante). Mas o restaurante seria, durante esse tempo, um verdadeiro templo. (...) Ali professavam sua fé no samba tradicional Ismael Silva, Nélson Cavaquinho, Carlos Cachaça, bambas da Mangueira, da Portela, do Império Serrano, do Salgueiro, de toda parte.
Eram dois shows, sempre nas noites de quartas e sextas. No primeiro, aqueles bambas se apresentavam sob a direção musical de Zé Kéti. No segundo, brilhavam Cartola e seu violão. Seguia-se o grand finale, no qual um convidado ilustre recebia a Ordem da Cartola Dourada, criada por Hermínio [Bello de Carvalho]. (...)
Foi Hermínio quem levou Paulo César ao Zicartola. Um fato importante na vida do então bancário, pois ali ele ficou conhecendo sambistas que, em sua timidez, eram entidades inatingíveis. Mais importante: passava a ser um deles. Desde sua estréia no primeiro show da noite, cantando sambas dos outros, causou forte impressão. Inclusive em Cartola, de quem Paulo César se aproximou humilde, cheio de cerimônia. O encontro dos dois é historicamente significativo, verdadeira passagem de bastão, sem que no entanto se tivesse consciência disso. Muito do que Paulo César estava por fazer – manter a tradição, sem maculá-la, requintar o samba sem deformá-lo – Cartola já vinha fazendo. Não fossem ambos tão tímidos, tão reservados, e seria inevitável se tornarem parceiros. Mas Zé Kéti também se encantou com o som do violão de Paulo César, sua musicalidade, sua voz terna, afinada, que combinava o timbre de autêntico sambista de escola com a técnica precisa de crooner profissional. O diretor musical do restaurante logo anteviu
 no moço de 20 anos um novo bamba. Copmentou isso com o jornalista Sérgio Cabral, que na época assinava, com José Ramos Tinhorão, uma seção de música popular no Jornal do Brasil e era mestre de cerimônias no Zicartola. Sérgio concordava. Mas achava que, definitivamente, Paulo César não era nome de sambista.
– Que tal Paulo da Viola? – indagou Zé Kéti, certamente inspirado em Mano Décio da Viola, veterano compositor do Império Serrano.
– Paulinho... Paulinho da Viola é melhor – completou Sérgio.
E assim Paulo César Baptista de Faria foi rebatizado para todo o sempre.” 

O vídeo é Clementina de Jesus, no Zicartola cantando "Ensaboa". 
Ai, ai que tivéssemos um lugar aqui em Buraco onde fosse realmente legal ir, tomar umas cervejas, ouvir umas músicas legais, conversar com pessoas queridas, etc.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Epifania, Literatura, Besteira e Gargalhada - quase uma paródia de um texto espetacular de Tiago esse título, não?


Desde os doze anos de idade eu fui fisgada pela escritura de Clarice Lispector. Nada intelectual. A coisa se deu da maneira mais táctil e sensível possível. Deparei-me com Água Viva e o li no quintal de casa. Ao terminar o livro eu sabia que um eu feminino escrevia para um tu masculino. Que esse eu era pintora e agora lidava com as palavras e que sentia o domingo parecido como eu sentia.
Eram as impressões de uma menina de doze anos.
Não larguei mais Clarice e as relações foram se dando sempre de maneira mais complexa. Até que decidi fazer o curso de Letras.
A relação com a obra da minha então escritora preferida não mudou. Continuava amorosa. Ela não era meu objeto de estudo e quando o foi, não me afastei. Pelo contrário, a aproximação era sempre e cada vez mais significativa.
Por esse motivo, deixei-a guardada só para mim e estudo hoje uma outra escritora que me emociona muito especialmente com a escritura do livro que se fez objeto do projeto de Mestrado. Ela é Alina Paim e o lviro é A sétima vez.
Acho que não consigo estudar de maneira mecânica. Para mim se faz necessário haver paixão.
A obra de Clarice Lispector e a de Alina Paim são plenas de construções linguísticas próprias, reforçadas por uma estrutura sintática peculiar, capaz de, simultaneamente, encantar e envolver o leitor em um universo linguístico e poético renovando conceitos de leitura.
Sabia eu que as obras de Lispector geralmente focam a epifania, traduzida em momentos de revelação, em que determinado personagem se defronta com a verdade.
Aliás, esse foi o tema da monografia que escrevi para concluir o terceiro período do curso (estranho, não é? Mas, foi isso mesmo: à época, não rolava TCC no curso de Letras aqui na UFS e fizemos monografia como uma tipologia textual na disciplina Produção de texto III).
Não me envergonho do que escrevi, uma vez que eu era semi-caloura à época.
A vida continuou. Os períodos foram se sucedendo. Concluí o curso e hoje estudo essa outra autora, sob um outro viés: o viés da memória.
Daí que de repente pensei: não é que há e muito de epifania nesse A sétima vez?
Também Teodoro (personagem principal do livro) é exposto a um acontecimento, que ele denomina de fenômeno, que muda sua vida, que o faz conhecer um tipo de verdade. Apesar de que todo seu envolvimento com esse tal fenômeno está ligado á duras questões como a Ditadura Militar brasileira, etc.
Não vou desenvolver à exaustão esse pensamento. Talvez ainda o faça por gosto para apresentar algum trabalho.
Agora, só fico mesmo feliz com o descortinar do pensamento à caminho da padaria.
Hoje já vivi ápices de sentires (vulgo raiva mesmo). Agora, me diverti para caramba com uma última espiadela no que mais me chateou e ri. Ri. Ri muito e tanto, que lembrei-me dessa denominação: epifania.
O descortinar de uma verdade. Um momento que transforma. Não aplica-se ao que citei agora que me fez rir, mas sim às duas escritoras.
E, assim, fico feliz de verdade.
Termino o dia às gargalhadas com a besteira que me fez rir de verdade e à bessa e feliz em ter percebido essa ligação entre duas grandes escritoras que estão comigo sempre.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Promessa cumprida


Porque promessa é promessa.
Porque são dias impagáveis os que nos juntamos.
Porque eu morri de rir com os desenhos que Jadson assitia quando era pequeno. Uma mulher toda cor-de-rosa, com uma dança para lá de drag e ele ainda ousava dizer que ela era cor-de-rosa, mas que tinha estilo.
Tudo bem. Nada a ver essas coisas com Tetê Spíndola e Clementina de Jesus, não é?
Não.
A gente inveredou, noite dessas, em assistir a tudo que era vídeo condizente com a nossa vida. E de Patrícia Marx a Diana e a desenhos toscamente animados, chegamos a ver esse encontro para lá de inusitado, boquiabertos.
Tiago, com urgência, falou que precisava muito ouvir mais Clementina de Jesus.
Eu, baixei o Pássaros na garganta de Tetê.
De todos a que mostro o encontro ouço: é insuportável ouvir Tetê. Odeio a voz de Tetê. É irritante ouvir Tetê.
Nós somos o outro lado. Rimos. Admiramos.
De qualquer forma, boa descoberta. Além de ter tido contato com uma foto muito peculiar que me passara uma mensagem de um encontro não acontecido na infância.... (preferi ser obscura proque se eu dissesse que morri de rir com a foto que vi, levaria um sermão....).
Enfim, sempre é mágico estar perto dessas pessoas enlouquecidas, gritantes do Maracujá mais erótico que já vi.

Da mágoa.


Constatei, com tristeza, que sou uma pessoa que carrega mágoas. E as carrego de uma maneira singular. Por isso, sempre me emociona ouvir essa passagem inteira do dvd da Elis Regina - dirigido, pasmem, por Daniel Filho para um especial da Rede Globo intitulado "Série Grandes Nomes" exibido em 1980. As músicas do trecho são Cadeira Vazia (Lupicínio Rodrigues), Atrás da Porta (Chico Buarque) e Essas Mulheres (Joyce).
Gravei na memória essa imagem de uma mulher bonita, um palco apenas com uma cadeira e os olhos da moça manchados com lágrimas negras.
Eu havia visto tal imagem de relance, numa das correrias de criança pela casa. E paralisei à época.
Há uns dois ou três anos, de tanto falar nessa imagem, agora nomeando a moça bonita com lágrimas negras de Elis Regina, ganhei o dvd. E sempre parava no trecho. E sempre sentia a mesma coisa de quando eu era criança.
Ontem, constatei o motivo. A letra de Lupicinio Rodrigues diz muito de como eu sinto mágoa.
Não odeio. Não detesto. Esqueço o gosto amargo da raiva com muita pressa. Porém, não consigo mais dar "carinho nem afeto" apesar de ser capaz de oferecer o meu teto.
Nomeio a isso de mágoa.
E eu sou dessas. Talvez fosse mais feliz de outro jeito. Mas, uma vez que alguém sai de meu coração: sai para valer. Não cismo com facilidade, mas quando cismo é para sempre.
Por isso o gosto por músicas "dor de cotovelo", por Almodóvar, pelo drama. Por isso os exageros, a entrega.
Sou brega. Desde pequena.
E a música, essa em especial, me fez conhecer um pouco mais de mim.
Não duvido que essa tenha sido uma das apresentações mais emocionantes da carreira de Elis Regina.
Termino o post lembrando-me de uma outra letra: "A fonte secou" de Raul Moreno:

Eu não sou água pra me tratares assim
Só na hora da sede é que procuras por mim
A fonte secou
Quero dizer que, entre nós, tudo acabou
(Bis)

Seu egoísmo me libertou
Não deves mais me procurar
A fonte do meu amor secou
Mas os teus olhos nunca mais hão de secar (Bis)

Pois é. Apesar de brega e de magoada, sou alguém que se diverte. E, como já constatou junto comigo um grande amigo querido: "Adoro música de vingança". 

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Umbigos do mundo, uni-vos!


Tem gente que acha que é o umbigo do mundo.
Tem gente que nomeia isso de umbiguismo.
A mim, só me irrita estar perto de pessoas assim, apesar de conhecer algumas tantas (na verdade, algumas poucas, graças!). Pois há muito que sei que o mundo não gira em torno de MEU umbigo.
Apoquenta-me estar perto de quem AINDA não saiu dessa fase. Disfarço. Mas, volto para casa com vontade de ter puxado a orelha de criança da criança que assim se comporta perto de mim.
O fenômeno umbiguístico é engraçadinho em criancinhas de verdade. Mas, poxa vida, depois de terras caminhadas, aos vinte e tantos anos nego anda por aí AINDA se comportando feito criancinha de cinco aninhos de idade? Ui, me socorra que sou o centro! Pelamordedeus!
Com o agravante de que tais criaturas se auto-boicotam contra o veemente umbiguismo disfarçando-o (mal) com teoriazinhas de quinta e irritabilidades magoadas!
Ave cruz!