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segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Vigiar e punir ou "das posições"


Toda a instituição parapenal, que é feita para não ser prisão, culmina na cela em cujos muros está escrito em letras negras: ”Deus o vê”.(Michel Foucault, Vigiar e Punir, pg. 242).

No terceiro capítulo de Vigiar e Punir, intitulado “O cárcere”, Foucault elege Mettray (lugar onde jovens delinqüentes ficavam depois de serem condenados nos tribunais) para fixar o que completaria a formação do sistema carcerário. Ao se perguntar pq Mettray ele responde que é porque “é a forma disciplinar no estado mais intenso, o modelo em que concentram todas as tecnologias coercitivas do comportamento”. E mais adiante ele nos diz como é feita a divisão em grupos e diz que “os chefes e subchefes em Mettray não devem ser exatamente nem juízes, nem professores, nem contramestres, nem suboficiais, nem “pais”, mas, um pouco de tudo isso e num modo de intervenção que é específico. São de certo modo técnicos do comportamento: engenheiros da conduta, ortopedistas da individualidades. Têm que fabricar corpos ao mesmo tempo dóceis e capazes”. E depois ele vai nos falando como se comportavam os homens da direção, os chefes e subchefes, como se vestiam (“tão humildes” quanto os internos), como estavam sempre próximos, vigiando-os (aos internos) dia e noite. Criavam uma rede de observação permanente. Etc.
Ontem, eu voltava para casa, e pensei: “Há os que vigiam e punem se algo sair das normas. Mas, estes (que vigiam e punem) não estão livres de serem vigiados e punidos, caso algo saia das normas”. E lembrei-me também do filme Saló de Pasolini e da rede de observação permanente que ali acontece, naquele casarão. E de como há um momento onde um sai “entregando” o outro para livrar-se das punições cada vez mais severas...
Essa tal rede (de observação permanente) é tecida e posta em prática até hoje: nos sistemas penais, em “casas de recuperação”, nos sistemas parapenais (ave as escolas (muito mais para os professores, até, pois, lembro-me de já ter postado aqui uma matéria que falava sobre a criação de quartos escuros para castigar professores)!) e em toda a parte, por vezes “disfarçados” de distração...

P.S.: devo explicar que essas coisas todas se passaram em minha cabeça porque eu estava sendo fiscal no vestibular ontem, o próprio sistema de fiscalização se dá assim: os fiscais vigiam os candidatos e os supervisores vigiam os que vigiam os candidatos. Além do que muitas vezes o ambiente escolar me lembra essa criação de “corpos dóceis e capazes” e ainda, andar em ônibus lotado de pessoas que nunca vi, voltando para casa, com calor, sono e cansaço e olhando uma placa que nos informa que para nossa segurança estamos sendo filmados, nos faz pensar coisas...

domingo, 29 de agosto de 2010

Identidade, autoridade e liberdade - o potentado e o viajante


Identidade, autoridade e liberdade - o potentado e o viajante é o nome de um dos textos do Edward Said que está no livro Reflexões sobre o exílio e outros ensaios.
Said refletia sobre o que falar numa determinada palestra quando encontrou-se com um colega ao qual pediu sugestões. O colega, então, perguntou-lhe o nome da palestra e ele respondeu que era Identidade, autoridade e liberdade. E o amigo disse-lhe: "Interessante. Você quer dizer que identidade é o corpo docente, autoridade são os administradores e liberdade…"Liberdade", disse ele, "é a aposentadoria".
Comentário não só chistoso, mas cínico, mas que apesar da irreverência, reflete sobre a questão da liberdade acadêmica.
Todo o texto vai versar, partindo de um ponto de vista bastante afetado pela situação da Palestina, com a qual Said se identifica por origem e por escolha e, dessa maneira, defende, sobre a Universidade, sobre a liberdade acadêmica.
Gostei muito de muitas passagens do texto. Posso dizer, de maneira menos hermética, que gostei do texto.
Especialmente me fez lembrar sobre os papéis que desempenhamos como estudantes mesmo, e me fez lembrar até do último post que li de Wesley sobre o Dumbo, sobre sua participação e insistência e esperança de servir para alguma coisa essa sua perseverança em exibir filmes na Universidade, mesmo ouvindo vez por outra, ou mesmo quase sempre, coisas absurdas que vão de filmes, gosto à concepções do que vem a ser infantil, leia-se, de como se concebe o que é uma criança.
A uma altura do texto, Said escreve que "Dizer que alguém estuda ou leciona é dizer que tem a ver com a mente, com valores intelectuais e morais, com um determinado processo de investigação, discussão e troca, atividades habitualmente não muito praticadas fora da academia".
Eu acho que esse trecho, mesmo assim deslocado, desapertado do inteiro do texto do Said, responde um pouco do que acho que deveria ser a academia.
_______________

Lendo-o pela terceira vez (e não vou ficar colocando passagens do texto aqui para não ficar algo muito acadêmico ou mesmo enfadonho), fiz muitas viagens pensando em outros textos. Lembrei-me de Clifford Gertz em Interpretações da Cultura, no texto Rinha de galos em Bali. Eu o havia lido e, recentemente, alguém o comentou ligeiramente e me fez rememorá-lo. Gertz diz em seu texto da dificuldade de colher depoimentos das pessoas envolvidas na rinha e que só os conseguiu quando a polícia chegou na área, todos correram e ele, por medo ou por intuição, correu junto. Daí, na próxima investida, o estudioso ouviu: "Vamos falar, pois você é um dos nossos".
Essa passagem do Gertz rememorada um santinho antes de meu contato com esse texto do Said me fez pensar em como o ambiente acadêmico é representado no imaginário de pessoas que não o freqüentam e até mesmo de nós que o freqüentamos.

Mais adiante, vejo escrito no texto de Said, esse fragmento: "Nenhum de nós pode negar o sentimento de privilégio levado para dentro do santuário acadêmico". Antes de falar sobre a questão do privilégio, me fez dar outra viajada a expressão santuário acadêmico. Viajei para o texto de Virginia Woolf: Um teto todo seu.
Lembrei-me da descrição irônica, irresistível do começo de seu texto. Virginia conta-nos de sua primeira inspiração (na verdade de como a sua primeira idéia fora cortada) para escrever a palestra que irá proferir sobre "A mulher e a ficção". Ela está tentando explicar como deveria construir um argumento para desenvolver a idéia de que a mulher, para escrever ficção, precisa ter dinheiro e um teto todo dela.
Virginia é acometida pelo "puxão"da idéia nascendo, à beira do rio (por esse motivo ela vai usar a metáfora do peixe pequeno para a idéia nascendo ainda). Assim que sente a inspiração para o desenrolar das idéias nascer, ela se levanta e se põe a caminhar. Logo, vê-se na grama, andando para um lado e para o outro. E, sente o primeiro embargo: Um bedel a interrompe. Ali só pode estar Estudantes. O lugar dela é no cascalho.
Ok. Ela acha que andar na grama é mais confortável que andar no cascalho, mas continua a andar, no cascalho e põe-se a pensar mais e mais porque perdera o fio da meada, ou como a mesma diz, perdera o seu peixinho (pois Virginia usa a metáfora do peixe pequeno para a primeira idéia nascente).
Lembra-se de referências bibliográfica e, lembra-se, de que pode consultá-las na biblioteca da Universidade de Oxbridge. Santuário que guarda tesouros como os que agora aparecem em seu pensamento.
Sobre as escadas, envolta em pensamentos mil que vai nos citando… Até que, pela segunda vez, é barrada. Agora, ouve que as damas só eram admitidas na biblioteca da faculdade acompanhadas por um Fellow (estudantes que tinham privilégios, que já haviam terminado os cursos, mas tinham ligação com a instituição, tipo pós-graduados) da faculdade ou providas de uma carta de apresentação.
Virginia se afasta, dessa vez possessa. Pensa em o que fará para o resto do dia. E a uma certa altura, encosta-se a um muro, de onde enxerga a universidade e nos diz: "Quando me encostei no muro, a universidade pareceu-me de fato um santuário onde se preservavam tipos raros, que logo se tornariam obsoletos se deixados a lutar pela existência nas calçadas do Strand".

Porque fiz tantas viagens para pensar e falar num só texto como o do Edward Said? Talvez não seja porque sou louca não. O subtítulo do próprio texto é o potentado e o viajante. Por todo o texto, então, perpassa a idéia de que não podemos justificar nosso anseio por justiça se defendemos apenas o conhecimento nosso e de nós mesmos. Portanto, nos diz Said que "o modelo de liberdade acadêmica deve ser o migrante ou o viajante, pois se no mundo real, fora do universo acadêmico, precisamos ser nós mesmos e apenas isso, dentro da academia precisamos ser capazes de descobrir e viajar entre outros eus, outras identidades, outras variedades da aventura humana. Mas - o que é mais essencial -, nessa descoberta conjunta do eu e do Outro, o papel da academia é transformar o que poderia ser conflito, disputa ou asseveração em reconciliação, reciprocidade, reconhecimento e interação criativa".

Claro que não estamos mais no tempo em que mulheres e negros não entravam nas universidades. Mas, não é demais reavivar um texto assim como o de Woolf. Não é demais reavivar lembranças traumáticas como a Shoah, o Apartheid, o que foram as ditaduras militares na América Latina, enfim, nunca é demais lembrar erros cometidos no passado. Até mesmo para não repetirmos esses mesmos erros no presente ou no futuro.

E o Outro de hoje, pode não ser a mulher, mas existem muitos Outros ainda. E a academia é um lugar para adotarmos espaço para pensar sobre a questão. Com liberdade. Adotando o ponto de vista de um viajante. Que muda a rota, que mesmo com mapa, se perde, conhece, observa, interage, pergunta, aprende na carne.

São questões a se pensar. Sobre o Outro. Sobre o cânone. Sobre o que se estuda e como se estuda. O que se aborda. E daí é tão importante nos perguntarmos: E criança não pensa?
Diziam isso dos índios os portugueses quando aqui chegaram. Diziam, esses mesmos portugueses, dos negros que não tinham alma.
Dizem das mulheres que pensam menos que os homens.

É bom viajar. Nos textos. Nas idéias. E construir junto com os outros passageiros da viagem que é optar por estar nesse ambiente que é a academia.

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Rabbits

Rabbits é uma série, dirigida por David Lynch, com oito episódios e, ao todo, dura mais ou menos 43 minutos.
São trÊs atores vestidos de coelhos, numa sala, a falarem coisas desconectadas uns com os outros. A cada entrada ou a cada uma ou outra descomunicação, ouvimos aplausos de um público, o que nos remete a programas cômicos de TV.
Nunca havia assistido outra coisa de Lynch que o Veludo Azul. A bactéria, a prostração, a insônia, me levaram a essa vontade de vê-lo mais.
Assim que terminei de assistir à série, que vim a saber é denominada por websisódios, uma vez que parece estar disponível no site do diretor, liguei para Jadson. Queria compreender, não no sentido já escrito e debatido por Tiaguinho, mas o problema é que nem mesmo sentir eu conseguia. Não me capturou nem pelo inteligível nem, pelo sensível e nem me deixoud esgrudar os olhos dos tais websisódios.
Queria ir até o final para saber se haveria algo mais. Os planos mais lembraram-me teatro filmado. Os sons, muitas vezes irritam. Assim como a ininteligibilidade. E o problema nem era eu não alcançar ou me sentir pequena por conta da não alcançabilidade. O problema era: o que é que ele qeuria com aquilo? O que transgredia? um jeito de se fazer cinema? Um costume de uma classe? O comprotamento do ser humano? A incomunicabilidade?
Jadson não havia assistido. E eu prometi que se eu procurasse explicações com as pessoas, na Internet, nos lviros, fosse onde fosse e a encontrasse, eu prometi que trataria de qualquer assunto, eu mesma, falando em árabe, em alemão, russo, japonês, de agora em diante.
Vim para o mais rápido e fácil: a lan hause. Não encotnrei grandes coisas que fosse diferentes das impressões que tive ao assistir à série.
Li coisas sobre o diretor ser "um profissional hiperativo que diz não conseguir ficar parado, sempre buscando alguma forma de realizar seu trabalho, seja no cinema, na tv, na fotografia ou em mídias experimentais como foi o caso de Rabbits, lançado inicialmente em seu site como websisódios".
Tenho que admitir que Rabbits é estranho, diferente e que vale a pena ver e buscar. Buscar não sei ainda o quê. Quem puder e quiser: me ajude.

E eu, assim imersa em bactéria e em David Lynch, quando escrevia esse post, recebi ligação de Wesley PC. Claro que não acho que seja por acaso.
 Ele me esclareceu coisas sobre o diretor, incluive falou sobre a saturação disso de ele ser sempre ininteligível, que ultimamente tem sido um teipo de "forçação de barra". Wesley junto com Jadson são dois monstrinhos comedores de filmes, né? Não viram essa tal de websisódio, mas sempre salvam, ajudam, esclarecem.
Vou continuar assistindo David Lynch. Já não vou me assustar com nada.
Gostei muito de Inland Empire. Vou olhar de novo para Rabbits. E tomara que essa bactéria saia logo de mim, porque revendo Naked Lunch, de David Cronenberg, quase senti uma enorme centopéia em minha garganta (invenção pura essa minha, agora) de tanto ela coçar.
Juro que o barato do pó, do inceticida, no filme, quase me fez espirrar e enxergar uma grande barata com boca falante e desejante de pó no meu velho computador!
Claro que o bichinho do qual mais gosto, no filme, é aquele quase escorpião meio bunda, meio pinto...
Ok. Isso não é um jeito bom de analisar nem de falar de filmes, né?
Além de infectada por bactérias, estou ficando sacrílega. Tmabém, pudera! Por que raios no Brasil não é Almoço Nu o nome do filme e sim "Mistérios e paixões", hein?
Bem, deixa eu voltar para meus contos, porque o cinema está me deixando confusa...


quinta-feira, 1 de julho de 2010

A velhice - seria um comentário, pois que sem mais: virou postagem!



Antes de tudo: também eu estava afastada de escrever aqui, um lugar que também eu aprendi a gostar. Estive mergulhada em livros por conta do mestrado e aproveitando o feriado-quase-férias para dormir também até bem mais tarde.
Li o texto de Jadito e comecei a comentá-lo. Decidi postar porque no comentáio não rola de colocar foto e eu queria ilustrar o texto com uma foto (ô, mania) e também lá não tem a opção de colocar nome de livro em itálico, colocar corezinhas (e hoje estou fresquinha, fresquinha). E também queria motivos para escrever aqui. Andava ressabiada...
Enfim, abaixo o texto-comentário:

"A velhice é o meu tema (falo tema que estudo no mestrado, no livro da Alina Paim, a memória e a velhice de Teodoro, personagem de A sétima vez). Assim como a morte muito me interessa, mas ainda não tive impulso (leia-se: coragem) de estudá-la. Adoro Teodoro, o personagem da Alina Paim porque ele tem 67 anos e nem por isso deixa de viver e de lutar pelo que acredita defensável: falar na época da Ditadura Militar brasileira. Adoro a Hilé, da Hilda Hilst que também está velha. Gosto da Olímpia, personagem de Adélia Prado (Quero minha mãe) porque ela também tem mais de 60 e o livro é foda e ela busca na memória a vida dela toda e a vida dela no presente não deixa de ser interessante porque ela tem mais de 60. Adoro todo o A via crucis do corpo, da Clarice porque traz muitos personagens velhos. A velhinha que arde, que se masturba. A outra que se perde no Maracanã, masque se perde mesmo é na vida (essa de outro livro de contos que não o A via crucis...). Um dos livros "teóricos" que mais me encantou foi o Memória e sociedade - lembranças de velhos, da Eclea Bosi. Os filmes como Umberto D, como aquele Hamaca Paraguaya (que vimos juntos) e outros tantos que tocam nesse tema me encantam. Me encantam e me fazem pensar.
E penso nas coisas que você escreveu e que fazem todo sentido para mim.
E lendo agora Matéria e Memória e A memória, a história e o esquecimento: tudo isso faz muito sentido para mim, sim! Sentido e significado.
Também tenho a sensação de intensidade guardada na pele, na boca, em mim. E tenho pensado que isso da eterna juventude, de enxergarmos a potência só na juventude,  as possibilidades do sexo só na juventude é mais uma construção, assim como o é a sexualidade, etc.
Lembro-me, agora, para fechar, do que propôs Hilda Hilst às escritoras: montar um bordel geriátrico! Ela já imaginava Lygia Fagundes Teles de luvas sete oitavos, no caixa a receber a grana...
Lembra-se do "Teje presa", da Hildinha?
Envelhecer faz parte.
E o nosso velho Bukowski?
E o nosso velho e erótico Carlos Drumond de Andrade?
Fecho, de verdade, com um poema dele:

Amor e seu tempo

Amor é privilégio de maduros
Estendidos na mais estreita cama,
Que se torna a mais larga e mais relvosa,
Roçando, em cada poro, o céu do corpo.
É isto, amor: o ganho não previsto,
O prêmio subterrâneo e coruscante,
Leitura de relâmpago cifrado,
Que, decifrado, nada mais existe
Valendo a pena e o preço do terrestre,
Salvo o minuto de ouro no relógio
Minúsculo, vibrando no crepúsculo.
Amor é o que se aprende no limite,
Depois de se arquivar toda a ciência
Herdada, ouvida. amor começa tarde.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Epifania, Literatura, Besteira e Gargalhada - quase uma paródia de um texto espetacular de Tiago esse título, não?


Desde os doze anos de idade eu fui fisgada pela escritura de Clarice Lispector. Nada intelectual. A coisa se deu da maneira mais táctil e sensível possível. Deparei-me com Água Viva e o li no quintal de casa. Ao terminar o livro eu sabia que um eu feminino escrevia para um tu masculino. Que esse eu era pintora e agora lidava com as palavras e que sentia o domingo parecido como eu sentia.
Eram as impressões de uma menina de doze anos.
Não larguei mais Clarice e as relações foram se dando sempre de maneira mais complexa. Até que decidi fazer o curso de Letras.
A relação com a obra da minha então escritora preferida não mudou. Continuava amorosa. Ela não era meu objeto de estudo e quando o foi, não me afastei. Pelo contrário, a aproximação era sempre e cada vez mais significativa.
Por esse motivo, deixei-a guardada só para mim e estudo hoje uma outra escritora que me emociona muito especialmente com a escritura do livro que se fez objeto do projeto de Mestrado. Ela é Alina Paim e o lviro é A sétima vez.
Acho que não consigo estudar de maneira mecânica. Para mim se faz necessário haver paixão.
A obra de Clarice Lispector e a de Alina Paim são plenas de construções linguísticas próprias, reforçadas por uma estrutura sintática peculiar, capaz de, simultaneamente, encantar e envolver o leitor em um universo linguístico e poético renovando conceitos de leitura.
Sabia eu que as obras de Lispector geralmente focam a epifania, traduzida em momentos de revelação, em que determinado personagem se defronta com a verdade.
Aliás, esse foi o tema da monografia que escrevi para concluir o terceiro período do curso (estranho, não é? Mas, foi isso mesmo: à época, não rolava TCC no curso de Letras aqui na UFS e fizemos monografia como uma tipologia textual na disciplina Produção de texto III).
Não me envergonho do que escrevi, uma vez que eu era semi-caloura à época.
A vida continuou. Os períodos foram se sucedendo. Concluí o curso e hoje estudo essa outra autora, sob um outro viés: o viés da memória.
Daí que de repente pensei: não é que há e muito de epifania nesse A sétima vez?
Também Teodoro (personagem principal do livro) é exposto a um acontecimento, que ele denomina de fenômeno, que muda sua vida, que o faz conhecer um tipo de verdade. Apesar de que todo seu envolvimento com esse tal fenômeno está ligado á duras questões como a Ditadura Militar brasileira, etc.
Não vou desenvolver à exaustão esse pensamento. Talvez ainda o faça por gosto para apresentar algum trabalho.
Agora, só fico mesmo feliz com o descortinar do pensamento à caminho da padaria.
Hoje já vivi ápices de sentires (vulgo raiva mesmo). Agora, me diverti para caramba com uma última espiadela no que mais me chateou e ri. Ri. Ri muito e tanto, que lembrei-me dessa denominação: epifania.
O descortinar de uma verdade. Um momento que transforma. Não aplica-se ao que citei agora que me fez rir, mas sim às duas escritoras.
E, assim, fico feliz de verdade.
Termino o dia às gargalhadas com a besteira que me fez rir de verdade e à bessa e feliz em ter percebido essa ligação entre duas grandes escritoras que estão comigo sempre.

O palhaço e a bailarina



Pela manhã, li o livro infantil escrito por Antonio Carlos Viana e Sônia Maria Machado, intitulado "O palhaço e a bailarina".
O palhaço e a bailarina é a história de Alegria, uma cidade triste que se renova com a chegada de dois artistas (o palhaço e a bailarina).
Mas, para lá de ser apenas isso, o livro mostra o surgimento de uma disputa. A cidade, uma vez alegre após o contato com as artes, passa logo a criar dois partidos: o da bailarina e o do palhaço, sem mesmo que esses saibam da tal cisão.
Os dois acabam por ficar tristes e buscam logo uma solução. A solução pensada não deixa de carregar beleza e faz com que surja uma nova expressão artística em Alegria: o teatro.
Assim, pode-se falar que a história é uma história de disputas e que mostra que cada um tem o seu espaço.
É uma fábula que fala sobre a arte e que não há uma arte melhor que a outra.
É um livro para crianças. Surgido, segundo os autores, das histórias que a professora Sônia contava para o seu filho numa rede para que este dormisse e viajasse na imaginação. Mas, que faz om que adultos pensem muito em suas ações.
As ilustrações são belas.
Apesar de numa primeira leitura, apressada, imaginarmos apenas a oposição entre o Bem e o Mal, o livro carrega um elogio às Artes necessário para que pensemos sobre as nossas relações com os outros.
O livro é belo. E é bom imaginar uma cidade chamada Alegria que é triste quando seus moradores não a preenchem com bons sentimentos, com bons momentos. É bom porque me fez pensar que toda e qualquer sociedade começa em minha testa (na testa de qualquer um de nós).
Lembrei-me das cidades imaginadas pelos bichos do Saltimbancos.
Todas elas seriam governadas por crianças.


quarta-feira, 16 de junho de 2010

Ciências x Humanidades

Alimento o pesadelo de que, em alguns anos, os aviões não decolarão, mas todos nós seremos muito elegantes.
...mas é o caso de perguntar por que somente a arte teria poderes civilizatórios.
Sem desmerecer os excelentes alunos de cinema, letras ou sociologia, é impossível negar que, para alguém sem grande talento ou dedicação, será sempre mais fácil ser medíocre num curso de humanas do que num de exatas.

Todas as citações são do documentarista João Moreira Salles retiradas de um texto publicado na última edição de domingo do jornal Folha de São Paulo, no caderno Ilustríssima.


Li o artigo uma única vez. No computador da Bicen.

(...)

O texto aqui

terça-feira, 15 de junho de 2010

Da mágoa.


Constatei, com tristeza, que sou uma pessoa que carrega mágoas. E as carrego de uma maneira singular. Por isso, sempre me emociona ouvir essa passagem inteira do dvd da Elis Regina - dirigido, pasmem, por Daniel Filho para um especial da Rede Globo intitulado "Série Grandes Nomes" exibido em 1980. As músicas do trecho são Cadeira Vazia (Lupicínio Rodrigues), Atrás da Porta (Chico Buarque) e Essas Mulheres (Joyce).
Gravei na memória essa imagem de uma mulher bonita, um palco apenas com uma cadeira e os olhos da moça manchados com lágrimas negras.
Eu havia visto tal imagem de relance, numa das correrias de criança pela casa. E paralisei à época.
Há uns dois ou três anos, de tanto falar nessa imagem, agora nomeando a moça bonita com lágrimas negras de Elis Regina, ganhei o dvd. E sempre parava no trecho. E sempre sentia a mesma coisa de quando eu era criança.
Ontem, constatei o motivo. A letra de Lupicinio Rodrigues diz muito de como eu sinto mágoa.
Não odeio. Não detesto. Esqueço o gosto amargo da raiva com muita pressa. Porém, não consigo mais dar "carinho nem afeto" apesar de ser capaz de oferecer o meu teto.
Nomeio a isso de mágoa.
E eu sou dessas. Talvez fosse mais feliz de outro jeito. Mas, uma vez que alguém sai de meu coração: sai para valer. Não cismo com facilidade, mas quando cismo é para sempre.
Por isso o gosto por músicas "dor de cotovelo", por Almodóvar, pelo drama. Por isso os exageros, a entrega.
Sou brega. Desde pequena.
E a música, essa em especial, me fez conhecer um pouco mais de mim.
Não duvido que essa tenha sido uma das apresentações mais emocionantes da carreira de Elis Regina.
Termino o post lembrando-me de uma outra letra: "A fonte secou" de Raul Moreno:

Eu não sou água pra me tratares assim
Só na hora da sede é que procuras por mim
A fonte secou
Quero dizer que, entre nós, tudo acabou
(Bis)

Seu egoísmo me libertou
Não deves mais me procurar
A fonte do meu amor secou
Mas os teus olhos nunca mais hão de secar (Bis)

Pois é. Apesar de brega e de magoada, sou alguém que se diverte. E, como já constatou junto comigo um grande amigo querido: "Adoro música de vingança". 

sábado, 5 de junho de 2010

“A INTENSIDADE DA PUNIÇÃO NÃO DEVE ESTAR ASSOCIADA À GRAVIDADE DO DELITO”

Este é o jargão mais repetido durante as aulas de Jornalismo Policial a que tenho que me submeter todas as manhãs de quinta-feira, precisamente às 7h da manhã. No início, eu costumava detestar as aulas, achá-las enfadonhas ou ideologicamente desviantes. Depois que li com atenção um dos textos utilizados como bibliografia básica e de perceber que a má fama do professor responsável pela disciplina deve-se mais a seu rigor avaliativo do que necessariamente ao seu mau-caratismo (não detectado por mim – o homem parece ser boa pessoa), percebi que este jargão é importante, ao mesmo tempo em que é difícil de ser aplicado: como crer que uma dada punição deva ser aplicada ser levar em consideração o que se sente em relação ao delito que supostamente engendra esta necessidade punitiva? Haja racionalismo para enfrentar esta situação, visse?

Dentro, portanto, de minhas medidas pessoais para “criar outros tantos demônios” (sem precisar matar os anteriores, diga-se de passagem, apenas reabilitá-los a nosso favor), creio que o enfrentamento risório dos problemas é sempre uma pedida válida – mesmo que estes sorrisos incomodam outrem. Ontem, disseram-me, de forma iracunda, que meu sorriso é irritante. E eu pouco liguei para isso e continuei a sorrir. Estava me sentindo bem. Precisava pôr isso para fora. E, enquanto eu sorrio, Alejandro Jodorowsky faz CINEMA com letras maiúsculas!

Wesley PC>

sábado, 29 de maio de 2010

AO QUE EU PERGUNTO: COMO CRITICAR ALGO SEM ENFIAR O DEDO EM ALGUM SEMELHANTE?

É complicado divergir ideologicamente. Mas, nem por isso, é recomendável esconder-se na concessão sem medidas, praticando uma polidez eterna, de caráter diplomático, que apenas contribui para que divergências desnecessárias entre pessoas que lutam por uma mesma causa sejam rigorosamente disseminadas pelos órgãos dominantes de controle midiático, supondo que se consiga perceber a realidade dos conflitos assim, pelo viés maniqueísta dos esquemas utópicos. Como defender uma causa sem acusar alguém de estar no extremo desta mesma causa e confundir o que deveria ser um irmão com um "inimigo"? Como?

Pergunto isso porque, neste sábado semi-chuvoso, entrei em contato com duas obras muito intensas em suas contradições e pendengas morais: o livro "A Miséria da Filosofia", de Karl Marx, contra alguns supostos dizeres imediatistas do líder anarquista Pierre-Joseph Proudhon; e o filme "Botinada - A Origem do Punk no Brasil" (2006), dirigido pelo deslumbrado Gastão Moreira, mas que me muito me irritou inicialmente por uma incursão enciclopédia do tema através de entrevistas nostalgicamente unilaterais. Por sorte, do meio para o final do filme, a reflexão comparece, nem que seja por vias involuntárias. E, como deveria ser, me deixou pensativo: como defender uma causa sem acusar alguém precipitadamente?

A imagem desta campanha sensacionalista (e funcional,em minha opinião) do PETA, importante órgão de defesa dos direitos animais, me ajuda a auto-questionar: como?