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segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

O pastor amoroso, Alberto Caeiro

Agora que sinto amor
Tenho interesse nos perfumes.
Nunca antes me interessou que uma flor tivesse cheiro.
Agora sinto o perfume das flores como se visse uma coisa nova.
Sei bem que elas cheiravam, como sei que existia.
São coisas que se sabem por fora.
Mas agora sei com a respiração da parte de trás da cabeça.
Hoje as flores sabem-me bem num paladar que se cheira.
Hoje às vezes acordo e cheiro antes de ver.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Linda não, aquelas tuias

Olha só a caboquinha que baixou no meu sonhar
Linda não, aquelas tuia
Meu sonho foi pras cucuia quando dei fé de olhar.
Bem dizer, o jeito dela era um cristal de flanela de tanto fofo e brilhar
De lindeza bem muitona, de fofura desossada
Beicinho do bago grosso de bicudez encarnada
Um pilãozinho de cintura, dez léguas de formosura de vastidão deleitada
Criaturinha agarroza, festejosa no chegar
Cosquenta pelo cangote, mulecota nos coisar
Com três horas de espio, não dá pro cabra espiar
De tanto perigo afoito, trinta e sete, trinta e oito, os chinelins de pisar
Dois risquin de sobrancelha, os ói azul festejado
Platibandinha de testa, sem franzido ou pinicado
Linda não, aquelas tuia
Dei dois viva de aleluia, nesse sonho iluminado.
Mas repare meu cumpade, Cuma se deu o sonhado
A mãe dela intrometeu-se, de oxente interrogado
Eu só estou, caboquinha, tu essa hora sozinha nesse sonho amatutado
Sois cabocla apetrechada, de padrescíceras virtudes
Não te mete no destroço de viver de sonho e osso com o fulaninho dos grudes
Tu sois a miss lindeira, primeira nata da nata
Baliza tricampeã do estadual da Prata
Sois cabocla zero um, dos CPF tudin
Zero um das bonitezas, rainha das maciezas, sois discípla do pudim
Vai-te embora desse sonho, repara teu atrapalho
Tu podes morrer pisada pelos coturnos do orvalho
Será que tu não enxerga que esse sonho é coisa ruim?
Se teu pai não fizer não nada, dou-te uma surra bem dada, com uma fita de cetim
Acordei mais retesado, do que tora de imbúia
Banhei o rosto vincado, com quatro águas de cuia
Nunca mais sonhei com ela.
Uh... desorderinha dela
Linda não, aquelas tuia.
(Jessier Quirino)

Nossa! O que há com teu peru?

O natal funciona mais ou menos assim para mim. Por isso que não canso de falar que há livros, músicas e filmes que falam por a gente...

"Espírito natalino é um saco preto, hordas de delinqüentes, turbas de atoleimados te exigindo caras, posturas, o riso alvar, cestas, granas e tu mesmo basicamente arruinado, e criancelhas peidando adoidadas, escoiceando os ares, e mãezinhas num azáfama de um cair de tarde bordelesco, pra lá pra cá, e Jeshua entregue às traças, imagine o arrepio do Divino vendo o trotoar dos humanos, enchendo as panças, arrotando grosso, chupando os dentes, enchendo as latrinas, as mandíbulas sempre triturando, e o nenen lá na manjedoura, entre a vaca e o jumento... Que pai é esse que manda o filho pra um planeta de bosta como é a Terra... Se fosse um bom pai, o filho teria encarnado num corvo, a gente só ficaria olhando lá pro corvo nas alturas e dizendo: olha lá o divino, olha que lindo! E o divino com asas, só de nos ver de longe se escafederia, tem dó, pai, aquela gente não, por favor, pai, Abracadabra, pai, me transforma em fumaça, em rojão, em poeira, mas me afasta daqui, me afasta!

E aquele médico bonzinho que arrancou os olhos do Einstein e pôs no vidro e agora vai vendê-los por cinco milhões de dólares! Meu Deus, meu Deus, e o olho tristíssimo (porque viu muito e muito compreendeu) lá no vidro zoiando...

Sim, é verdade, eu tenho medo das gentes, pra dizer a verdade eu me cago de medo das gentes! O que eu tenho visto de pulhas, de máscaras atadas dia e noite sobre umas caras de pedra... O que eu tenho visto de mesquinharia, de crueldade, de torpeza, de estupidez... Que Natal? Que Natal? mudou o quê depois do nascimento do bebê?

"Óia a véia de novo enfezada! E até sendo paga pra escrevê só mardade! E nóis aqui no bem-bom comendo esses pardá, essas rola e esse gato gordo da vizinha! e que que tem cagá? que que tem rrotá? e chupá dente num é bom? e pur que ela chama a gente de delinquente? que que é horda, hen? e turba? E querê que o divino seja corvo, ó dotô, manda prendê essa muié, que eu até esqueci de fritá os ovo do menino Josué, também que que tem, é Natar e ele já tava morto!" Bom dia! Bom almoço!".

Hilda Hilst, in: Cascos & Carícias

Adélia Prado - Para o Zé



Para o Zé



Eu te amo, homem, hoje como toda vida quis e não sabia, eu que já amava de extremoso amor o peixe, a mala velha, o papel de seda e os riscos de bordado, onde tem o desenho cômico de um peixe — os lábios carnudos como os de uma negra.

Divago, quando o que quero é só dizer te amo.

Teço as curvas, as mistas e as quebradas, industriosa como abelha, alegrinha como florinha amarela, desejando as finuras, violoncelo, violino, menestrel e fazendo o que sei, o ouvido no teu peito pra escutar o que bate. Eu te amo, homem, amo o teu coração, o que é, a carne de que é feito, amo sua matéria, fauna e flora, seu poder de perecer, as aparas de tuas unhas perdidas nas casas que habitamos, os fios de tua barba.

Esmero. Pego tua mão, me afasto, viajo pra ter saudade, me calo, falo em latim pra requintar meu gosto:

"Dize-me, ó amado da minha alma, onde apascentas o teu gado, onde repousas ao meio-dia, para que eu não ande vagueando atrás dos rebanhos de teus companheiros".

Aprendo. Te aprendo, homem. O que a memória ama fica eterno. Te amo com a memória, imperecível.

Te alinho junto das coisas que falam uma coisa só: Deus é amor. Você me espicaça como o desenho do peixe da guarnição de cozinha, você me guarnece, tira de mim o ar desnudo, me faz bonita de olhar-me, me dá uma tarefa, me emprega, me dá um filho, comida, enche minhas mãos.

Eu te amo, homem, exatamente como amo o que acontece quando escuto oboé. Meu coração vai desdobrando os panos, se alargando aquecido, dando a volta ao mundo, estalando os dedos pra pessoa e bicho.

Amo até a barata, quando descubro que assim te amo, o que não queria dizer amo também, o piolho.

Assim, te amo do modo mais natural, vero-romântico, homem meu, particular homem universal.

Tudo que não é mulher está em ti, maravilha.

Como grande senhora vou te amar, os alvos linhos,a luz na cabeceira, o abajur de prata; como criada ama, vou te amar, o delicioso amor: com água tépida, toalha seca e sabonete cheiroso, me abaixo e lavo teus pés, o dorso e a planta deles eu beijo.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

O amor e o sertão

"O sertanejo é antes de tudo um paciente". Essa frase está lá em A hora da estrela, de Clarice Lispector. A minha escritora favorita. Já percebi que o sertão está cada vez mais dentro de mim. E ter relido A hora da estrela para a disciplina Identidade Cultural e ter feito isso estudando o sertão e o sertão de Guimarães de Grande sertão: veredas e de Noites do sertão, me fez desejar estudar a sensualidade e o sertão. Ou o amor e o sertão. Não sei se há muitos estudos sobre. Mas, tmbém não sei se desejo isso para pesquisa. Mas, pensar essas coisas me tem deixado feliz, ultimamente.

Jessier Quirino (ou das coisas bonitas que acontecem em nossas vidas)

Conheci Jessier Quirino através de Rogério. No incício de nosso namoro. Ele me apresentou muitas letras e eu adorei todas. Assim que ouvi essa, lembrei logo de minha mãe e tratei de mostrar-lhe. Ela, entre risonha e emocionada, adorou também. Logo, passamos a achar coisas dele e a ouvir juntas. Já vi duas vezes o show dele e sempre ri muito e me emocionei também. A primeira vez que o vi, comprei um cd e pedi que o autografasse e dedicasse a Rogério (era uma tietagem, mas era também uma meira de agradecer a Rogério ele me te mostrado Jesiier...). Aqui vai a letra de "Vou-me embora para o passado":

Vou-me embora pro passado
Lá sou amigo do rei
Lá tem coisas "daqui, ó!"
Roy Rogers, Buc Jones
Rock Lane, Dóris Day
Vou-me embora pro passado.
Vou-me embora pro passado
Porque lá, é outro astral
Lá tem carros Vemaguet
Jeep Willes, Maverick
Tem Gordine, tem Buick
Tem Candango e tem Rural.
Lá dançarei Twist
Hully-Gully, Iê-iê-iê
Lá é uma brasa mora!
Só você vendo pra crê
Assistirei Rim Tim Tim
Ou mesmo Jinne é um Gênio
Vestirei calças de Nycron
Faroeste ou Durabem
Tecidos sanforizados
Tergal, Percal e Banlon
Verei lances de anágua
Combinação, califon
Escutarei Al Di Lá
Dominiqui Niqui Niqui
Me fartarei de Grapette
Na farra dos piqueniques
Vou-me embora pro passado.
No passado tem Jerônimo
Aquele Herói do Sertão
Tem Coronel Ludugero
Com Otrope em discussão
Tem passeio de Lambreta
De Vespa, de Berlineta
Marinete e Lotação.
Quando toca Pata Pata
Cantam a versão musical
"Tá Com a Pulga na Cueca"
E dançam a música sapeca
Ô Papa Hum Mau Mau
Tem a turma prafrentex
Cantando Banho de Lua
Tem bundeira e piniqueira
Dando sopa pela rua
Vou-me embora pro passado.
Vou-me embora pro passado
Que o passado é bom demais!
Lá tem meninas "quebrando"
Ao cruzar com um rapaz
Elas cheiram a Pó de Arroz
Da Cachemere Bouquet
Coty ou Royal Briar
Colocam Rouge e Laquê
English Lavanda Atkinsons
Ou Helena Rubinstein
Saem de saia plissada
Ou de vestido Tubinho
Com jeitinho encabulado
Flertando bem de fininho.
E lá no cinema Rex
Se vê broto a namorar
De mão dada com o guri
Com vestido de organdi
Com gola de tafetá.
Os homens lá do passado
Só andam tudo tinindo
De linho Diagonal
Camisas Lunfor, a tal
Sapato Clark de cromo
Ou Passo-Doble esportivo
Ou Fox do bico fino
De camisas Volta ao Mundo
Caneta Shafers no bolso
Ou Parker 51
Só cheirando a Áqua Velva
A sabonete Gessy
Ou Lifebouy, Eucalol
E junto com o espelhinho
Pente Pantera ou Flamengo
E uma trunfinha no quengo
Cintilante como o sol.
Vou-me embora pro passado
Lá tem tudo que há de bom!
Os mais velhos inda usam
Sapatos branco e marrom
E chapéu de aba larga
Ramenzone ou Cury Luxo
Ouvindo Besame Mucho
Solfejando a meio tom.
No passado é outra história!
Outra civilização...
Tem Alvarenga e Ranchinho
Tem Jararaca e Ratinho
Aprontando a gozação
Tem assustado à Vermuth
Ao som de Valdir Calmon
Tem Long-Play da Mocambo
Mas Rosenblit é o bom
Tem Albertinho Limonta
Tem também Mamãe Dolores
Marcelino Pão e Vinho
Tem Bat Masterson, tem Lesse
Túnel do Tempo, tem Zorro
Não se vê tantos horrores.
Lá no passado tem corso
Lança perfume Rodouro
Geladeira Kelvinator
Tem rádio com olho mágico
ABC a voz de ouro
Se ouve Carlos Galhardo
Em Audições Musicais
Piano ao cair da tarde
Cancioneiro de Sucesso
Tem também Repórter Esso
Com notícias atuais.
Tem petisqueiro e bufê
Junto à mesa de jantar
Tem bisqüit e bibelô
Tem louça de toda cor
Bule de ágata, alguidar
Se brinca de cabra cega
De drama, de garrafão
Camoniboi, balinheira
De rolimã na ladeira
De rasteira e de pinhão.
Lá, também tem radiola
De madeira e baquelita
Lá se faz caligrafia
Pra modelar a escrita
Se estuda a tabuada
De Teobaldo Miranda
Ou na Cartilha do Povo
Lendo Vovô Viu o Ovo
E a palmatória é quem manda.
Tem na revista O Cruzeiro
A beleza feminina
Tem misse botando banca
Com seu maiô de elanca
O famoso Catalina
Tem cigarros Yolanda
Continental e Astória
Tem o Conga Sete Vidas
Tem brilhantina Glostora
Escovas Tek, Frisante
Relógio Eterna Matic
Com 24 rubis
Pontual a toda hora.
Se ouve página sonora
Na voz de Ângela Maria
"— Será que sou feia?
— Não é não senhor!
— Então eu sou linda?
— Você é um amor!..."
Quando não querem a paquera
Mulheres falam: "Passando,
Que é pra não enganchar!"
"Achou ruim dê um jeitim!"
"Pise na flor e amasse!"
E AI e POFE! e quizila
Mas o homem não cochila
Passa o pano com o olhar
Se ela toma Postafen
Que é pra bunda aumentar
Ele empina o polegar
Faz sinal de "tudo X"
E sai dizendo "Ô Maré!
Todo boy, mancando o pé
Insistindo em conquistar.
No passado tem remédio
Pra quando se precisar
Lá tem Doutor de família
Que tem prazer de curar
Lá tem Água Rubinat
Mel Poejo e Asmapan
Bromil e Capivarol
Arnica, Phimatosan
Regulador Xavier
Tem Saúde da Mulher
Tem Aguardente Alemã
Tem também Capiloton
Pentid e Terebentina
Xarope de Limão Brabo
Pílulas de Vida do Dr. Ross
Tem também aqui pra nós
Uma tal Robusterina
A saúde feminina.
Vou-me embora pro passado
Pra não viver sufocado
Pra não morrer poluído
Pra não morar enjaulado
Lá não se vê violência
Nem droga nem tanto mau
Não se vê tanto barulho
Nem asfalto nem entulho
No passado é outro astral
Se eu tiver qualquer saudade
Escreverei pro presente
E quando eu estiver cansado
Da jornada, do batente
Terei uma cama Patente
Daquelas do selo azul
Num quarto calmo e seguro
Onde ali descansarei
Lá sou amigo do rei
Lá, tem muito mais futuro
Vou-me embora pro passado

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Notícias de uma paz particular?

Estou numa lan hause...em Propriá...bem perto do Velho Chico. Já o olhei de soslaio, enquanto vinha aqui para falar urgente com Rogério. Vim resolver problemas. Mas, claro que olhei bem a gurizada saindo da Fundação Bradesco e me vi entre eles. Pequeninha, loirinha, presepeira, tímida...criança ainda.

Depois qu resolver tudo: vou dar uma olhada gingantesca no rio de minha infância. Vou passar também em frente à casa da minha meninice e vou dar um abraço na minha melhor amiga de infância: acabamos de marcar isso.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Existe o cinema brega?


Alguem já ouviu falar em cinema brega? Bem, se sim ou se não, pode colocar “VIAJO PORQUE PRECISO, VOLTO PORQUE TE AMO” na lista de filmes bregas , mas não pense que o brega aqui referido é aquele pejorativo que alguns gêneros musicais levam de longe tal pecha. O conceito de brega referido aqui é a ideia de pathos, palavra grega que significa exatamente apaixonado e por isso patético, desmedido, algo que o velho Platão considerava uma conduta no mínimo deselegante. Sabe aquelas músicas que ouvimos quando estamos com dor de cotovelo e bebendo muito para esquecer do amor que nos deixou e que no fundo clamamos para que ele volte?. Pois bem, este é exatamente o filme de Marcelo Gomes e de Karin Ainüz e é um filme que já mais passaria nas telas da acadêmia platônica, pois até seu último fotograma ele transpira intensa paixão.

Vi o filme no último domingo da forma mais inusitada possível, em que o comentário “ele só fala e nunca aparece não é?, já estou ficando agoniada!” pode dá uma ideia de quão inusitado foi, mas isso só aumentou a intensidade de como eu via o filme. Filme que me deixava em estado perplexo e de perene ebulição, pronto para explodir em lágrimas, por que sabe aquele ditado “entre a dor e o nada eu prefiro a dor” nunca se justificou tanto.

Narrado por um personagem em off, e que a partir de uma câmera subjetiva nos leva ao interior do nordeste, acompanhamos essa viagem insólita de um geólogo em busca de esquecer uma paixão por uma botânica de cabelos loiros, a qual se reportava carinhosamente como “ galega” e ainda afirmava que formavam o par perfeito, pois enquanto ele escavava pedras, ela colhia flores. Num primeiro momento ele só fala da saudade doida que sentia dela , enquanto passava pelas áridas cidades do interior do nordeste, de sol rachante, poeira sufocante e de pessoas sofridas, mas que apesar de tudo humanas. No segundo momento descobrimos que ele rompeu com a galega e para esquecer embarca numa viagem sofrida. E o calvário ainda é pouco pois ele viaja porque precisa e não volta porque ainda ama!

Para quem viu “ O céu de Suely” e “Madame Satã”, não demora a perceber que é Karin Ainüz que dita o tom do filme. Ele humaniza os personagens numa força estonteante, vide a sequencia em que o personagem se entrega a prostituição, lembrando muitas vezes situações vividas por personagens dos filmes citados. Mas a grande sacada dos cineastas foi o roteiro que se coadunou as imagens capitadas pelas câmeras utilizadas no processo de filmagem de forma brilhante. E ainda fica claro a referencia a cineastas como Eduardo Coutinho, Jean Rouch, Chris Marker e Jorge Bodansky.

Enquanto um “galego” não faz com que eu sinta dor na vida, vou deixando de lado o nada, para recordar para sempre essa pequena obra-prima....


beijos passionais

J.

sábado, 28 de agosto de 2010

Memória e subjetividade amorosa


"Uma memória coletiva se desenvolve a partir de laços de convivência familiares, escolares, profissionais. Ela entretém a memória de seus membros, que acrescenta, unifica, diferencia, corrige e passa a limpo. Vivendo no interior de um grupo, sofre as vicissitudes da evolução de seus membros e depende de sua interação. Quando sentimos necessidade de guardar os traços de um amigo desaparecido, recolhemos seus vestígios a partir do que guardamos dele e dos depoimentos dos que o conheceram. O grupo de colegas mal pode constituir um apoio para sua lembrança, pois se dispersou e cada um se integrou num meio diverso daquele que conheceu. Como salvar sua lembrança senão escrevendo sobre ele, fixando assim seus traços cada vez mais fugidios?" (Ecléa Bosi, in: Memória e Sociedade - Lembranças de velhos)

Impossível para mim reler esse livro da Ecléa Bosi e não fazer, a cada releitura, uma releitura de mim mesma com a minha mãe, com a minha infância, com o meu passado, com os espaços os quais já percorri e, portanto, com o meu presente.
Não temo dizer que meu principal objetivo ao trabalhar com a temática da memória no mestrado seja o de nunca esquecer. Seja o de estar sempre perto de minha mãe.
É como se eu tivesse um dever de memória, precisasse criar um lugar de memória, para falar nos termos de Pierre Nora.
E não há dúvida de que identidade e memória tem muito a ver um com o outro. E ao estudar memória, acabo constituindo uma noção grande de identidade. Acabo pensando coisas sobre mim e sobre ela (a minha mãe) e sobre o lugar que nos abrigou por quase toda a minha vida que foi a cidade de Propriá e sobre Aracaju essa cidade sempre presente também em nossas vidas. E assim, talvez me confunda mais e melhor sobre o que seja eu. Sobre o que foi ela. Sobre o que é que fui eu. Sobre quem é ela.
Outro dia estava eu a ler um livro escrito por Todorov chamado O homem desenraizado. Ele começa esse seu livro falando sobre a experiência que viveu ao viajar para ministrar uma palestra na Bulgária. A Bulgária é o seu país de origem. E ele retornou, depois de um exílio "circunstancial", como o próprio diz ter sido o seu, uma vez que não foi convidado a sair de seu país por motivos nem políticos (diretamente) nem econômicos ou de qualquer outra ordem. Foi uma opção. E ele não optara ingenuamente por deixar deixar uma terra "marginal"(em se pensando que Paris, lugar para onde foi, era, à época o "império" ou lugar onde outros lugares estariam em sua órbita). Ele foi estudar e lá ficou. Mas, é verdade que nunca concordou com a política governamental desenvolvida em seu país.
Depois de 18 anos fora de seu lugar de origem, distante lingüística e emocionalmente de seu lugar de origem, ele se viu em Sófia. Em sua casa. Reencontrando a mãe, amigos e até seus sapatos de jardinagem que sabia que eram seus pois que ainda guardavam os mesmos vícios de seus pés, as mesmas marcas.
Mas, antes, anos antes, Todorov nos conta que sonhava um sonho recorrente. Sonhava que visitava seu lugar de origem e, quando estava prestes a voltar à França, ia para estação de trem e de lá não conseguia sair. As situações nos sonhos eram muitas e variadas. Vezes havia esquecido a passagem em casa e se voltasse perderia o trem, outras ele entrava na estação, mas ao atravessá-la nada via que não fosse mato, outras ainda, estava de carona com um amigo que pegava um atalho e se perdia e chegavam atrasados à estação.
Ele estava impossibilitado de voltar à sua terra eleita, a França. E isso o apavorava.
Era um sonho. E quando se viu prestes a viajar de verdade para esse mesmo lugar dos sonhos e que era o de sua origem, ele tratou de prevenir possíveis não-voltas. Casou-se com a companheira de anos, escreveu a amigos que mantinham contato com a imprensa todos os dados de onde estaria e o que iria fazer lá, enfim, precauções que nos parecem absurdas ao lermos seu texto, mas que não são tão absurdas assim se lembrarmos que a Sófia vivia um regime autoritário comunista e que não seria tão absurdo acontecer-lhe algo.
Uma vez em Sófia, Todorov vive um processo estranho e dominante de reflexão quanto à sua identidade. Ele sente como se fosse um personagem duplo. Oras ele é o personagem búlgaro, outras ele é o personagem francês.Tudo o que se passava em seu interior, antes, com tranqüilidade, sem violência, todo o processo de desculturação, aculturação e de transculturação já vivenciados e já "superados", tudo veio à tona quando este se viu na Bulgária.
Foi preciso temer perder uma identidade escolhida, foi vivendo o embate junto aos que ficaram, foi se perguntando o que seria ele se ele não tivesse saído, foi pensando em tantas coisas que ele chegou a compreender que as identidades culturais não são apenas nacionais, existem outras ligadas aos grupos pela idade, pelo sexo, pela profissão, pelo meio social. Foi vivendo certas coisas na carne, como se de repente tivesse que não agir de maneira simples, mas sim ligando e desligando tomadas de si mesmo: a tomada búlgara, a tomada francesa, a tomada de ser filho, a tomada de ser amigo, a tomada de ser um intelectual que ia proferir uma palestra num país onde era estrangeiro e pertencente ao mesmo tempo, a tomada de ser isso ou aquilo. Entendeu, então, que em nossos dias todos já vivemos, ainda que em níveis diferentes, este reencontro de culturas no interior de nós mesmos.
E ao ler Todorov testemunhando um processo de identidade e de memória, eu lembrei de um conto de Luis Borges, que está em O livro de areia, chamado O outro. Nesse conto, Borges velho encontra-se com Borges jovem. Não são o mesmo. É seu duplo. Apesar de ser o mesmo Borges em tempos diversos, são pessoas diferentes. Vale a pena ler o conto. Por que agora estou já cansada de tanto fluxo de pensamento. De tanto sentir entrecortado. Já falei demais. E tudo isso para dizer que morro de saudades e que encontrei um jeito sim de ficar mais perto de minha mãe. E está aqui na memória, em cada coisa que escrevo, que relembro, que monto de novo. Mergulho. Superfície. Tudo ao mesmo tempo.
E tudo isso me ajuda a deixar de ser preconceituosa. A tentar compreender que se eu sou construção, também ela foi para ela mesma e para mim e continua a ser. Assim como qualquer outra pessoa. Assim como acontece com todo mundo.
Mas, ser construção não significa deixar de ser verdade.
E se um mesmo homem não mergulha num mesmo rio porque ambos, homem e rio, já não são o mesmo, como querer de mim ou dela ou de qualquer pessoa que seja algo estático?
E eu não falo aqui de hipermodernidade, de pós-modernidade, de tudo líquido.
Falo de possíveis e prováveis preconceitos mesmo. De como a gente encara uma mãe, uma mulher.
Minha mãe era uma mulher inquieta. Buscava coisas (e aqui coisas não é só o que de material possa existir, mas sim também idéias, sentires, etc.). Era inconformada com muito do que viveu, do que vivia. E isso é o que foi mais marcante dela para mim.
Isso estava em sua voz, grossa, rouca, de gritar para a vida. Seus grandes olhos verdes. Sua postura ereta. Ela era alta. E dizia ter só tamanho. Pois que se via como uma manteiga derretida. Isso estava em suas memórias, no que ela lembrava dos anos 60, de como rememorava o golpe de 64, ela com 20 anos de idade. Como ela reconstruía as ruas de Prporiá, a festa de Bom Jesus, o Cine Veneza, alguns tantos acontecimentos políticos. Como ela me explicava os nomes das ruas ou de como as ruas eram conhecidas.
Eu a amava e a temia (não só porque ela era a minha mãe, mas porque ela sabia assustar quando ficava brava). Respeitava. E falávamos de tudo. E éramos verdadeiramente amigas. Mesmo que vez ou outra ela dissesse: "Ei, mocinha, a mãe aqui sou eu, viu?". Ela era muito conversadeira (era assim mesmo que falávamos rindo quando varávamos a noite conversando: hoje estou conversadeira, estou com o conversador aberto).
Ela era intensa e como pessoa intensa não vivia as coisas por oportunismo ou de maneira reducionista.
Amava. E por amor sofreu.
Fumava. Parou um mês antes da morte. Parou porque estava doente e não podia mais. Mas, o cigarro era o seu companheiro. Daquelas tantas horas de insônia e que eu estava dormindo. E daqueles momentos que todos nós temos: aqueles que a gente não deixa ninguém penetrar, por mais que a gente ame muito, sabe?
Ela era assim e muito mais. Porque ela era gente. Gente  muito gente. E, como disse Clarice Lispector, para além de gente ela era uma Pessoa. Assim com maiúscula.
Ela era uma Pessoa. Tinha suas máscaras, seus sonhos, seus silêncios, suas brigas, suas opiniões, sua voz. Suas escolhas, suas dúvidas. Suas contradições. Era, enfim, uma Pessoa.
Amava música, livros, cinema. Falava sempre de tudo o que via, lia, assistia. E adorava pessoas e solidão. E era bonita, vaidosa. Era crítica, nada falava ou pensava sem fazer reflexões sobre.
Depois, adoeceu. Encucou com muita coisa. Na verdade com uma coisa. Desprezou o seu corpo. Mas, ela era tão e tanto, que mesmo depressiva, que mesmo doendo sempre, que mesmo com câncer, que mesmo sentindo dores recorrentemente, mesmo assim ela era encantadora. E, antes e depois, se permitia. Era uma Pessoa.
E eu morrerei se me esquecer de como foi especial, diferente, importante, feliz ter nascido dela, ter sido criada por ela, ter vivido tudo o que vivi com ela.
Tudo o que eu disser sempre vai ficar aquém. Pois é indizível ter tido a oportunidade de ter vivido ao lado dela.  De ter experimentado o que experimentamos.
Por isso pessoas como Kelli, como Suyanne, como Deise, como mesmo Tiago, como Delaninho, como Gustavo, com Cândida, como Silvinha, Dênia, Lísia, como todos os meus amigos (tantos, tantos, tantos que se eu for citar vou escrever eternamente) que a conheceram são tão importantes também como figuras que conviveram com ela meio que para testemunhar uma época, um fato, uma pessoa, um acontecimento. Que cantaram na cozinha lá de casa, que riram, que choraram, que ouviram-na tanto com sempre suas muitas histórias, que falaram, desabafaram (porque muitos de meus amigos falavam das coisas, conversavam mais com ela do que comigo sobre amores, dúvidas, medos, incertezas). Ela sabia ouvir como ninguém.
Era controversa. Chegando a ser engraçado. Lembro-me de que um dia, quisemos descobrir porque ela juntava a gente em casa, conversávamos cantávamos, bebíamos muito café, comíamos uma coisinha ou outra (porque ela adorava cozinhar e adorava que as pessoas gostassem das comidas que ela fazia ou mesmo, ela era toda jeitosa, cortava queijo, colocava azeitonas, um patê, biscoitinhos num prato e refrigerante a vista, copos para quem quisesse se servir…sempre tinha que oferecer algo, mas sem a insistência chata, era sempre como se partisse de nossa vontade e como ela sabia respeitar os outros!) e de repente, todos nós decidíamos ir embora, deixar para continuarmos os papos e a cantoria amanhã, mas isso sempre coincidia com o cansaço dela. Ela juntava a gente sem que a gente percebesse e desfazia o ajuntamento sem que a gente percebesse também. Era ao bel-prazer dela, a danada. Ela sempre charmosa, cheia de conversa mole. E a gente caindo, caindo.
Quando digo que era gente, Pessoa, é que ela mudava de humor, ficava triste, zangada, não queria ver ninguém, depois voltava toda alegre, eufórica, e isso nem sempre era assim tão evidenciado ou tão antagônico e demarcado, era um cotidiano, um dia-a-dia, mas ela driblava isso com uma beleza simples (se bem que outras tantas sofisticadas).
Pintava quadros, panos, toalhas, bordava, coloria as coisas, dava um outro tom. Lembro-me de ela ter pego uma toalha de renda toda branca e tê-la pintado. Pintou flor por flor. Ainda guardo a tal toalha, inclusive ainda a uso. Ficou um trabalho ímpar. Belo. E ela feliz, orgulhosa, mas,  muito sinceramente soltou: "Essa vai ser a única, pois estou com os olhos arrombados, ô gota!". Era assim. Espontânea. E desarrumava as coisas para rearrumá-las com graça, com arte, com beleza.
Adorava Augusto dos Anjos e o Castro Alves sensual. Citava-os sempre. E vivia lembrando de que o beijo era a véspera do escarro.
Claro que de uma personalidade como a dela eu só posso morrer de falta.
Não era submissa, não passava desapercebida nunca. E me ensinou que a amar e ser amado não significa subjugar a outra pessoa nem estar subjugada.
Não era utilitarista. Não puxava saco. Apesar de ser carinhosíssima e muito compreensiva. Tinha um olho de lince. Sabia viver.
Não olhava para trás quando andava e dizia que se alguém a chamasse pelo segundo nome, nunca acharia que era com ela.
Falava do tempo em que seu pai era gerente de um grande cinema em Propriá com tamanha paixão que me apaixonava também pelas suas histórias. E acho que acabei testemunhando um tempo que não o meu. Como é viva a imagem de um homem que perdera a mãe, foi ao cinema, assistiu a um rama, riu a sessão todinha e, quando todos foram embora, chorou copiosa e dolorosamente, sozinho, emborcado, caído da cadeira, em posição de feto. Essa era uma lembrança dela, que eu herdei e posso testemunhar. Eis a memória coletiva aí, minha gente!
Suas histórias cheias de invenções e memória (pois a memória vem carregada de invenções muitas vezes) faziam dela uma pessoa única para a idade, para a região, para o tipo de vida e os sofrimentos todos que já havia passado e que passava ainda.
Era uma grande amiga.
Outro dia, me enchi de coragem e fui visitar a sua melhor amiga. Elas eram unha e carne há trinta anos. Aprontaram juntas na juventude e era linda a cumplicidade delas.
Ela não era a mesma pessoa. A falta de mainha na vida dela era tão destruidora quanto na minha. Ficamos eu e ela a nos olhar e a saber da falta daquela mulher em nossas vidas. Não tínhamos nada a fazer. A morte é mesmo assim. Ela me disse, perdi a minha amiga. Com os olhos cheios de lágrimas. E eu respondi: eu também.
Ela deixou de fumar no enterro de minha mãe. Mas, depois, a saúde dela declinou. Era como se minha mãe fosse uma força para ela. Quatro anos depois da morte de minha mãe foi como se ela tivesse envelhecido anos. Se minha mãe tivesse viva, talvez isso não tivesse acontecido e aquela jovialidade estivesse ainda pulsando.
Elas  trocavam bilhetes engraçados. E eram irmãs, irmãs. Tia Marilene era testemunha da vida de minha mãe, do que era a mãe de minha mãe para minha mãe. Pois que elas também tinham tido uma amizade muito bonita. Mas, era uma relação muito mais tradicional de mãe-filha, muito mais diferente do que foi a nossa…

Enfim…falta. Vontade de um dedo de prosa com ela que era tão inteligente, tão viva e vivaz, tão interessante, tão envolvente, tão charmosa, tão não cansativa.
Saudades de suas invenções. Saudade de levantar no meio da noite e ela estar fazendo alguma peripécia, de eu perguntar o que era e ela desenrolar um fio de Ariadne e mais fios e fios e dali por diante evocarmos Minemosyne, Clio, Apolo….e Vênus.
A memória, a história, a arte e o amor. Foram ensinamentos que ela me deixou. E são coisas que ela ressignificava a todo momento. Eu sinto falta. Muita. Latente. Para sempre.



sexta-feira, 27 de agosto de 2010

Notícias do mundo de cá: o nascimento de uma criança - reflexões para o mundo dos mortos ou do silenciamento

Fumei um cigarro preto hoje. Negro era o meu semblante. Negra a interrogação quanto ao meu futuro. O que desejo de verdade?
Inconformada eu? Nem sei do que não me (in)conformo ou o que mesmo desejo. Porque do impossível eu já sei que não se fala.
O cigarro negro da solidão que venho fumando desde mesmo quando você era viva e estava comigo estranhamente não amarga na boca. Amarga por dentro quando sabemos da possibilidade do câncer. Do câncer que ferra a vida, a alma e a fala da gente.
Fumávamos as duas desse cigarro, mamãe. Você na sua geração e eu na minha. Você e eu fumávamos desse cigarro mesmo quando não fumávamos nada e quando não havia fumaça.
Lembrávamos de um tempo que não chegamos a viver. Também eu não vou chegar lá.
Ontem soube do nascimento de mais uma criança em nossa família. Eles também não me procuram. Como antes, estamos sós. Estou só.
Há uma outra família. A qual não pertenço, mas que diz ter-me abraçado por conta de um dos membros. Há uma linha de não-entrega tão demarcada que muitas vezes eu rio, sabia?
Lá eu como, durmo, tomo banho. Mas, não sou. Lá eles são eles e eu a parte. Mas, as pessoas, mamãe, continuam a fingir. Também eu o faço. Mas, não muito bem, pois sempre em crise. Vivo sempre em crise.
Sabia que nunca mais um abraço de verdade? Nunca mais ninguém tirou cravos de minhas costas. Eles saem no banho, com os óleos com os quais tomo banho. É. Tenho tentado parecer um pouco com você. Assim, os óleos durante os banhos e os hidratantes depois.
Outro dia achei um dos que você usava. O cheiro me emocionou. Mas, não havia muito sentido em dividir isso com outra pessoa.
Este é um escrito desorganizado. Como sou desorganizada.
Como é possível, mamãe, alguém como eu, hein?
Nasci mesmo assim? Fui-me transformando? O processo sempre foi silencioso? Será sempre?
Enfim, são tantas coisas. Algumas dizíveis sim, mas não por ora. Por ora, só a negra fumaça do cigarro da solidão.

domingo, 22 de agosto de 2010

Sabedoriaamor implícitos

Hoje é dia da minha mãe. Acordou tagarela. Porque isso é isso, aquilo é aquilo, etc etc... E no final, angustiada com pesada frustração, disse: Eu não tenho sabedoria para conversar com vocês - Embora eu tenha mantido uma cara séria, fazendo-me de casmurro, impenetrável e sentimentalmente hermético, por dentro eu sorria.

Uma vontade de beijar aquelas bochechas penduradas e de cheirar-lhe o cangote rechonchudo e dizer ainda: sua boba, é AMOR o que está me ensinando!

Lembrei-me de uma das poesias mais lindas e profundamente sensíveis que já li aqui nesse blog da Adélia Prado, postada certa vez por Ninete. Repito-a aqui tomado por estranha paz. Estranha paz é efeito de amor?


Ensinamento


Minha mãe achava estudo
a coisa mais fina do mundo.
Não é.
A coisa mais fina do mundo é o sentimento.
Aquele dia de noite, o pai fazendo serão,
ela falou comigo:
"Coitado, até essa hora no serviço pesado".
Arrumou pão e café , deixou tacho no fogo com água quente.
Não me falou em amor.
Essa palavra de luxo.


sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Entre a orgia violenta de Rubem Fonseca e o dilema politico-moral de Eloy de la Iglesia


Já vi quatro obras do esquecido diretor espanhol Eloy de La Iglesia e de fato fiquei extasiado com dois dos quatro filmes dele que pude assistir o primeiro “O Sacerdote” que narra a crise de um padre que transpira desejo por todos os poros e que se auto-flagela na tentativa de domar o corpo até perceber que o espírito é também parte fundante de seu hiper-libíbo, a narrativa lembra muito os planos oníricos do magnânimo Buñuel e o roteiro prima por contestação política ímpar. O segundo é de um impacto que estou sem fôlego até agora, “El Diputado” é sem dúvidas o melhor filme do diretor, apesar de ter visto poucos, acho difícil algum outro superá-lo, mesmo porque acho ele um dos melhores filmes da minha vida, sem exageros! O filme é surpreendente e conta a história de um deputado do partido comunista recém eleito depois da queda da ditadura de Franco, é clandestinamente homossexual e casado com uma bela mulher, se envolve continuamente com michês, só que a mando do partido fascista um michê se envolve com ele na intenção de provocar um escândalo, e derrubá-lo politicamente. Só isso já era grandioso visto que o dilema moral vivido pelo personagem já funcionaria belamente, mas Eloy não se contenta e constrói um verdadeiro libelo em prol do amor. PERFEITO! Agora virei fã também querido Wesley de Castro.
“Lúcia McCartney “é o livro que me minha amiga me emprestou ontem para ler, escrito pelo meu contista favorito Rubem Fonseca, o qual a tempo já era fã, conta uma porção de coisas ainda estou no início do livro, mas várias histórias paralelas estão se desenrolando acredito que vão se tocar de algum modo. Até agora o livro se apresenta de forma primorosa, conciso pungente e como sempre violentíssimo, estou a adorar. O fato é que os personagens do Rubem me cativam de uma forma acachapante. Amo a densidade do indivíduo construído pelo autor, ele é absolutamente genial.
Esperando por mais coisas de ambos.....

Beijos.

JT

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Acordei, abri os olhos e ainda deitado: "eu sei que hoje é um dia como outro qualquer, mas HOJE eu quero brincar ."



DÊ UM ROLÊ
Composição: Moraes Moreira / Galvão


Não se assuste pessoa
Se eu lhe disser que a vida é boa
Não se assuste pessoa
Se eu lhe disser que a vida é boa
Enquanto eles se batem
Dê um rolê e você vai ouvir
Apenas quem já dizia
Eu não tenho nada
antes de você ser eu sou
Eu sou, eu sou, eu sou amor
Da cabeça aos pés
Eu sou, eu sou, eu sou amor
Da cabeça aos pés
E só tô beijando o rosto de quem dá valor
Pra quem vale mais o gosto do que cem mil réis
Eu sou, eu sou, eu sou amor
Da cabeça aos pés
Eu sou, eu sou, eu sou amor
Da cabeça aos pés


Aos meus amigos com carinho...

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Rua de mão única

Gosto muito de Walter Benjamin.
Não é por pimbice não (risos). É mesmo por me sentir inapta tantas vezes a compreender quem escreve muito difícil. E Benjamin nao escreve difícil (ao menos sempre). Rua de mão unica, por exemplo, trás uma escritura leve, brincalhona, erótica, porque trata de coisas tão cotidianas, tão perto de nós de maneira táctil ou a apertar o botãozinho mais emotivo para mim que é o da memória. A relação que o moço traz com os livros é assim:

I. Livros e putas podem-se levar para a cama.
II. Livros e putas entrecruzam o tempo. Dominam a noite como o dia e o dia como a noite.
III. Ao ver livros e putas ninguém diz que os minutos lhes são preciosos. Mas, quems e deixa envolver mais de perto com eles, só então nota com têm pressa. Fazem contas, enquanto afundamos neles.
IV. Livros e putas têm entre si, desde sempre, um amor infeliz.
V. Livros e putas - cada um deles tem sua espécie de homens que vivem deles e os atormentam. os livros, os críticos.
VI. Livros e putas em casas públicas - para estudantes.
VII. Livros e putas - raramente vê seu fim alguém que os possuiu. Costumam desaparecer antes de perecer.
VIII. Livros e putas contam tão de bom grado e tão mentirosamente como se tornam o que são. Na verdade eles próprios nem o notam. Anos a fio alguém vais e entregando a tudo "por amor" e um dia está lá como corpus bem corpóreo, na ronda das calçadas, aquilo que 'para fins de estudo" sempre pairava somente acima delas.
IX. Livros e putas gostam de voltar as costas quandos e expõem.
X. Livros e putas remoçam muito.
XI. Livros eputas - "Velha beata - jovem devassa".
XII. Livros e putas trazem suas rixas diante das pessoas.
XIII. Livros e putas - notas de rodapé são para uns o que são, para as outras, notas de dinheiro na meia.

Dá para falar que essa pessoa não se relaciona com os livros de maneira erótica, sensual?
E isso me fascina, me faz saber das coisas. Porque simples, porque táctil. Ora, para um intelectual falar de livros: tudo bem. Mas, falar de putas e de forma poética, assim... Não, não é um estudo antropológico sobre prostituição. É uma relação. Bonita, feia, bruta, de poder, de igualdade, de necessidade, de amor... Uma relação. Assim como a com os livros.

Esse texto (Livros e Putas) se intitula "N. 13", a saber.
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E um outro texto desse mesmo livro (Rua de mão única) com o nome de "Estas plantas são recomendadas à proteção do público"traz algo que me fascina:

"Quem ama não se apega somente aos "defeitos"da amada, não somente aos tiques e fraquezas de uma mulher; a ele, rugas no rosto e manchas hepáticas, rospas gastas e um andar tortoprendem muito mais duradoura e inexoravelmente que toda beleza. Há muito tempo se notou isso. E por quê? Se é verdadeira a teoria de que a sensaçãonãos e aninha na cabeça, que não sentimos uma janela, uma nuvem, uma árvore no cérebro, mas sim naquele lugar onde as vemos, assim também, no olhar para a amada,e stamos fora de nós. Aqui, porém, atormentadamente tensos e arrebatados. Ofuscada, a sensação esvoaça como um bando de pássaros no esplendor da mulher. E, assim, como os pássaros buscam proteção nos folhosos esconderijos das árvores, refugiam-se nas sensações sombrias rugas, nos gestos desgraciosos e nas mdoestas máculas do corpo amado, onde se acocoram em segurança, no esconderijo. E nenhum passante advinha que exatamente aqui, no imperfeito, censurável, aninha-se a emoção amorosa, rápida como uma seta, do adorador".

Ai como gosto de ver o amor assim. E a beleza idem. Essa coisa táctil e verdadeira, que vai acontecendo, amadurecendo...O corpo é isso. Mas, não deixa de ser belo, desejável, poema e erotismo.

Para fechar a minha declaração de amor (e não de pimbice - mais risos) a Walter Benjamin e a seu Rua de mão única, deixo a dedicatória que ele fez do livro à sua amada italiana:

"Esta rua chama-se Rua Asja Lacis, em homenagem àquela que, na qualidade de engenheiro, a rasgou dentro do autor".

Entre "Toy Store 3" e "Três formas de amar"


No último sábado vi com um casal porreta esses dois filmes lá em casa, o primeiro em uma cópia pirata que estava quase inasistível, tanto que preciso revé-lo, mas mesmo assim tenho que concordar com Wesley de Castro o filme tem sacadas geniais e tenho que falar que o filme respeita a inteligência das crianças ao mesmo tempo que alcança os sentidos enfadados de nos adultos, a nostalgia, a crítica focaultiana e o ode a amizade me cativaram demasiadamente.

O segundo é pura nostalgia visto que o vi a muito tempo atrás e ele ficou marcado na minha memória como um dos grandes filmes adolecentes que eu vi, e nossa rever ele foi um bálsamo ele não é tão triste como eu pensava que seria mais é encantador do mesmo modo e assim como o filme anterior é uma grande homenagem ao sentimento que nos invade quando temos grandes amigos.

Tenho saudades dos meus queridos amigos que amo tanto e relembro de nossas aventuras e poxa vomos nos ver urgente!



Jadson

terça-feira, 20 de julho de 2010

Hoje é dia do amigo, só HOJE?



Nossa, como sempre meu aniversário redeu lindos momentos, inesquecíveis e eternos.

Vê todos juntos ou quase juntos é de uma emoção impar.

Sendo bem simples e sem nenhum filosofema, EU ADORO VOCÊS!

adoro a todos e gradeço a cumplicidade, o carinho e as pungentes palavras, meus queridos me confundo em vocês ao mesmo tempo que sei que não sou voces!

E adoro envelhecer ao lado seu..............(rs)

AMO-VOS!

Jadson Teles

terça-feira, 22 de junho de 2010

Algumas considerações sobre o amor- parte II


O segundo pensador que trago aqui para falar do amor é o dinamarques Soren Kierkegaard, que propõe uma espeie de ética cristã, vejamos um poquito.

Para Kierkegaard, o amor só pode ser conhecido através de seus frutos, de suas obras, pois ele tem uma vida oculta e se revela, se manifesta na necessidade de ser reconhecido e assim se faz pelos frutos, assim como pensamento que se revela na expressão do discurso, assim é o amor cristão que se movimenta e tem a eternidade em si. Não podemos conhecer a origem do amor pois ele se funda misteriosamente no amor de Deus. Portanto, só é possível conhecer os frutos aquele que crê no amor, “Só aquele que permanece no amor pode conhecer o amor do mesmo modo como seu amor deve ser conhecido1”.
Kierkegaard nos lembra que o mandamento “ amarás a teu próximo como a ti mesmo” pressupõe que o homem ama a si mesmo e deve amar a todos como a ti mesmo, ou seja, o amor por ele elogiado não é de forma alguma egoico, na exigência do amor ao próximo não se deve amar desmedidamente, o amor de si é a medida. O verdadeiro amor é dirigido a todo o gênero humano. O próximo não é aquele que está mais perto, mas o outro, ou seja, todo e qualquer homem.
O dinamarquês afirma que o próximo é uma reduplicação, “ como a ti mesmo” contido na lei divina afasta a possibilidade de um amor egoísta, pois o homem egoico não suporta a ideia de reduplicidade. Há no pensamento de Kierkegaard uma clara preocupação com a alteridade do indivíduo, com um amor que se concretiza num dever que tem como medida a sua própria subjetividade.


JT

segunda-feira, 21 de junho de 2010

BONNE ANIVERSAIRE!

Hoje nasceram: Alexandre, o Grande (em 356 a.C.), Machado de Assis (em 1839), Jean-Paul Sartre (em 1905), Nelson Gonçalves (1919), Eduardo Suplicy (em 1941), Manu Chao (em 1961), entre muitos outros. Mas a pessoa que amo e que nasceu neste dia consegue se destacar nesta lista inteira. Nasceu em 1982 e em comum com esta imagem da militante Jane Hanói (Fonda, de nascimento) tem a graça, a beleza e a pujança defensiva diante dos contínuos ataques ideológicos. Parabéns cardíacos para minha doce e maracujada Ninalcira de Lemos Sampaio! Só não fui para tua festa-surpresa (ops!) por causa de minha moléstia, visse?

Wesley PC>

terça-feira, 15 de junho de 2010

Promessa cumprida


Porque promessa é promessa.
Porque são dias impagáveis os que nos juntamos.
Porque eu morri de rir com os desenhos que Jadson assitia quando era pequeno. Uma mulher toda cor-de-rosa, com uma dança para lá de drag e ele ainda ousava dizer que ela era cor-de-rosa, mas que tinha estilo.
Tudo bem. Nada a ver essas coisas com Tetê Spíndola e Clementina de Jesus, não é?
Não.
A gente inveredou, noite dessas, em assistir a tudo que era vídeo condizente com a nossa vida. E de Patrícia Marx a Diana e a desenhos toscamente animados, chegamos a ver esse encontro para lá de inusitado, boquiabertos.
Tiago, com urgência, falou que precisava muito ouvir mais Clementina de Jesus.
Eu, baixei o Pássaros na garganta de Tetê.
De todos a que mostro o encontro ouço: é insuportável ouvir Tetê. Odeio a voz de Tetê. É irritante ouvir Tetê.
Nós somos o outro lado. Rimos. Admiramos.
De qualquer forma, boa descoberta. Além de ter tido contato com uma foto muito peculiar que me passara uma mensagem de um encontro não acontecido na infância.... (preferi ser obscura proque se eu dissesse que morri de rir com a foto que vi, levaria um sermão....).
Enfim, sempre é mágico estar perto dessas pessoas enlouquecidas, gritantes do Maracujá mais erótico que já vi.

sábado, 12 de junho de 2010

O QUE EU ESTOU A LER AGORA:


“Sabe como é que eu imagino a felicidade? Acho que, quando a gente é feliz, a gente está junto de alguém que tem a pele muito fina e depois a beijamos nos lábios e tudo se encobre de uma névoa rósea e o corpo da pessoa se transforma numa multidão de espelhinhos e, quando olhamos para ela, somos refletidos milhões de vezes”...

A citação segue em frente, mas acho que, até onde eu fui, já dá para imaginar o que a peça “O Arquiteto e o Imperador da Assíria”, de Fernando Arrabal, está a me causar gozo intenso: simplesmente genial!

Wesley PC>