quinta-feira, 12 de agosto de 2010

A desistência

Ontem, ela desistiu.
Desistiu exatamente quando ia começar a chorar. A voz começava a falhar porque a garganta apertara num nó que umedeceu seus olhos. Mas, ela desistiu.
Lembrou-se de Macunaíma, seu anti-herói mais querido, que havia começado a chorar quando fora abandonado pela mãe no meio da capoeira logo depois de negar comida aos seus irmãos. O herói pensou em chorar, olhou para um lado e para o outro. Percebeu que estava só, de modo que não chorou não e se pôs a andar. Logo depois, correndo do curupira, Macunaíma descobria que já não era mais menino.
Desistir não era fácil. Ou não havia sido fácil até aquele momento nada especial nem um pouco magnânimo. Simplesmente aconteceu.
Levantou-se da cama. Tomou um remédio que a ajudasse a dormir. Não por conta da desistência. A desistência não a abalou. Mas, porque se estirara na cama o dia inteiro e, desse modo, à noite, não havia sono.
Ela era tantos cacos depois de anos que parou também de contabilizar isso e de pensar de que ponto se reconstituiria. Os rumos estavam dados e a desistência a deixava preguiçosa também e ela ia vivendo o que já estava traçado, pré-traçado, não numa conformação cristã, não. Mas, no “deixa a vida me levar”.
Acordou não mais pensando em nada. Preencheu um formulário como todos preenchem formulários. Lembrou-se de um gosto de cereja provado há poucos dias. Escreveu um texto e foi viver o dia.

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